Meio Ambiente

Gigante que corre por 2.695 km, Rio Paraguai tem menor nível em 55 anos

Nesta terça-feira, o rio atingiu 12 centímetros em Ladário, que tem coleta de dados hidrológicos desde 1900

Aline dos Santos | 22/09/2020 13:35
Rio Paraguai, em Corumbá, exibe bancos de areia. (Foto: Toninho Ruiz)
Rio Paraguai, em Corumbá, exibe bancos de areia. (Foto: Toninho Ruiz)

Um gigante que corre por 2.695 km entre a nascente no Mato Grosso até desaguar no Rio Paraná, o Rio Paraguai vê suas águas minguarem em 2020, chegando aos menores índices registrados em cinco décadas. Sem o pulso de inundação, o Pantanal tem segundo ano consecutivo de seca e, mais uma vez, foi devorado pelo fogo. 

De acordo com o SGB (Serviço Geológico do Brasil), comparando com o histórico de monitoramento na região, de Mato Grosso a Mato Grosso do Sul, a vazante deste ano aproxima-se das observadas no período entre os anos de 1968 e 1973. Ou seja, faz 50 anos que não se registravam níveis tão baixo no Rio Paraguai.  Especificamente em Cáceres (MT), 2020 tem a menor marca em 55 anos: 53 centímetros.  

Nesta terça-feira (dia 22), o rio foi medido em 12 centímetros pela Marinha em Ladário, a 419 km de Campo Grande. Neste ano, a maior marca foi 2,10 metros, registrada em 8 de junho.  Desde o mês de julho, o nível das águas do  Paraguai só faz descer. 

No Forte Coimbra, a 204 km de Corumbá, a marcação na régua nesta terça-feira é de -0,84 centímetros. 

Segundo o pesquisador Marcelo Parente Henriques, no ano de 1973, a marca em Ladário foi de -2 centímetros em 19 de outubro. A projeção para o mês que vem é que o rio chegue somente até -11centímetros na régua instalada em Ladário. 

Sobre os números negativos, ele explica que o zero é uma referência. “No início de 1900, estimou-se que aquele zero seria um nível que o rio jamais atingiria”, diz. 

Em 1910, há 110 anos, cenário também foi de seca no Rio Paraguai como mostra imagem da Biblioteca Nacional.

Mas para demonstrar de que a natureza não se dobra a estatísticas, em 1910, o nível foi de -48 no mês de outubro.  “Há 110 anos não tinha agronegócio, grandes cidades, veículo automotor e o evento se apresentava. Acho precipitado afirmar que é muita agressão ambiental. Precisa de um coletivo de pesquisadores para estudar as mudanças que estão acontecendo”, afirma Marcelo. 

No ciclo das águas, a maior cheia do Rio Paraguai foi em 1988, com máximo de 6 metros e 62 centímetros. Na série histórica, a situação mais severa de seca foi em setembro de 1964.

Nos meses de junho ou julho, quando o nível de água na régua de Ladário atinge cota igual a quatro metros considera-se que houve a  cheia.

Porto Murtinho, cidade ás margens do Rio Paraguai. (Foto: Toninho Ruiz)

Bancos de areia - Em Porto Murtinho, a 431 km de Campo Grande, o  rio registrou hoje a marcação de 1,52 metro, a menor marca de 2020. 

Do alto, imagens com drone mostram bancos de areia no rio. Jornalista em Porto Murtinho, Toninho Ruiz conta que o curso de água não comporta mais barcaças com 25 comboios, como era comum na região.

 A chuva até chegou ao município, mas o volume das águas do rio Paraguai depende dos seus afluentes. Como diz a composição Comitiva Esperança, de Almir Sater e Paulo Simões, “vai descendo o Piqueri, o São Lourenço e o Paraguai”. 

Época da fartura - Presidente do Instituto Homem Pantaneiro, Ângelo Rabelo destaca o avanço do assoreamento no Rio Paraguai e faz comparativo com o Taquari, que foi asfixiado por sedimentos. 

“O Rio Taquari ajuda a exemplificar a nossa preocupação. Estamos acelerando o processo de aporte de sedimentos para a planície. Encurtando uma janela de tempo de cem anos. A prevenção deve começar no planalto, nas nascentes”, afirma.

Conforme o instituto, entre a Barra do São Lourenço, localizada em Corumbá, e Porto Murtinho, são 60 pontos de obstrução do Rio Paraguai. O cenário é retrato do processo natural de depósito de sedimentos numa planície, mas também indica que o volume cresceu e o rio perdeu a capacidade de  transportá-lo. 

Num ecossistema de ciclos, Rabelo lembra que o Pantanal vem de 35 anos de cheia. Mas na década de 60, era possível cruza o Paraguai-Mirim de carro, no que se convencionou como a época da fartura no Pantanal. 

A lógica que predominou foi que quanto mais terra à disposição para  o gado, maior o rebanho. 

“É fundamental que o governo possa implementar uma política pública para restabelecer essa atividade econômica, criando linha de crédito e uma política diferenciada para a região. Com 300 anos de ocupação não tem estrada, energia e comunicação”, afirma o presidente do Instituto Homem Pantaneiro. 

Em 18 de agosto, em frente ao Casario de Corumbá, Rio Paraguai já registrava recuo das águas. (Foto: Marcos Maluf)

Estrada fluvial – Uma das preocupações no Rio Paraguai é a navegação, essencial para transporte de produtos vitais para a economia de Mato Grosso do Sul. 

De acordo com Aldo Barrigosse, administrador e especialista em comércio internacional, pelos portos de Corumbá e Porto Murtinho são escoados soja e minério, base do comércio exterior, junto com a celulose. 

 Segundo o economista Eugênio Pavão, a soja parte com destino ao Mato Grosso. Já o ferro e manganês circulam na hidrovia Paraguai-Paraná até a Argentina. 

 Gigante – O Rio Paraguai nasce  na Chapada dos Parecis (MT)  e segue na direção sul, percorrendo  o limite entre os biomas da Amazônia e do Cerrado, adentrando no Pantanal, na região de Cáceres, por onde segue até deixar o Brasil para o Paraguai. 

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