Comportamento

Com aula em contêiner, escola rural faz pouco das dificuldades e vira modelo

Aline dos Santos | 16/09/2011 11:25

Filhos e filhas de trabalhadores rurais ganham oportunidade de futuro

Além da grade curricular tradicional do ensino fundamental, os estudantes têm aulas diversificadas. (Foto: João Garrigó)
Além da grade curricular tradicional do ensino fundamental, os estudantes têm aulas diversificadas. (Foto: João Garrigó)

Ter aulas em um contêiner abrasador no Verão, gelado no frio e onde entra água nos dias de chuva seria uma barreira intransponível em qualquer escola. Mas a 30 km de Campo Grande, um colégio municipal fez pouco das dificuldades e virou modelo, oferecendo aos filhos e filhas de trabalhadores rurais uma oportunidade de futuro.

No distrito de Rochedinho, a escola Barão do Rio Branco faz pulsar a pequena vila de 67 famílias, quatro bares e quatro igrejas. Vindos de fazendas, chácaras e assentamentos, os cem alunos começam o dia com pão, leite ou suco. Enquanto o refeitório não é construído, o desjejum é servido no centro comunitário. As aulas vão das 8h às 15h, com intervalos para lanche e almoço.

Além da grade curricular tradicional do ensino fundamental, os estudantes têm aulas sobre cultivo de horta, jardinagem, oficina de rádio, aulas de informática, produzem o jornal da escola, participam de um projeto de coleta seletiva e reciclagem. E ainda sobra fôlego para aula de violão, leitura, exibição de filme e atividades na quadra.

A receita de como tirar o máximo do mínimo vem do diretor Ernestino Antônio de Oliveira, há quatro anos à frente da escola. “Nada é feito sem a participação do aluno. Tudo é pensado para o aluno. Ele é o mais importante”, ensina.

Num campo cada vez mais hightech, a sala de informática, com acesso a internet, é o xodó dos adolescentes. No local também está o equipamento de rádio, que faz a diversão na hora do intervalo.

No comando do microfone, estava Ivonice Rodrigues dos Santos, de 11 anos. “A gente escolhe as musicas, dá recados”, explica a aluna do sexto ano, que mora em uma das fazendas da região.

Última a descer do ônibus que sai do colégio em direção à Capital, Gislaine Garcetes, de 16 anos, conta com uma vantagem em relação aos colegas. Mais próximo de Campo Gande, ela tem internet na chácara. “Uso o notebook do meu padrasto. Faço pesquisa sobre as matérias”, afirma. Na escola, a atividade preferida é o trato com a terra. “Gosto de plantar, cuidar da horta”.

Duas salas de aula são de estrutura metálica e temperatura varia conforme condições climáticas. (Foto: João Garrigó)

Encaixotados - Na escola modelo, a reclamação fica para as estruturas metálicas transformadas em duas salas de aula e uma sala de professores. Nesta última, alem dos ventiladores de teto e climatizadores, foi instalado um ar-condicionado cedido pela direção. A estrutura tem um ano.

As salas de aulas são mais antigas e já completam três anos. É aguardada uma reforma, com troca de porta, substituição das janelas que não fecham e permitem a passagem da chuva, além da colocação de potentes ares-condicionados de 30 mil Btus.

Por hora, o refresco vem dos ventiladores e climatizadores. Também será construída uma biblioteca e instalado um telecentro, para que a comunidade tenha acesso gratuito à internet.

Escola de sonhadores - Ao chegar à escola Barão do Rio Branco – fundada em 1937 a pedido do fazendeiro Alceu Tavares - o diretor não se deixou abater pelo estado do imóvel, cuja última pintura datava da década de 60. Como quem sabe faz a hora e não espera acontecer, formou uma grande equipe , apostando em parcerias e dedicacão

Enquanto a merendeira Dorinha comanda as panelas, garantindo o cardápio predileto da meninada, com arroz carreteiro, salada e feijão; o professor Francisley Galdino da Silva tenta diversificar as fontes de conhecimento, com destaque para a produção do informativo Barão, que tem circulação bimestral.

O jornal de quatro páginas surgiu de um problema. A escola quer melhorar os índices de leitura e interpretação de texto. “Poderia mandar fazer redação, mas aí, só o professor lê. Para fazer o jornal, os alunos precisam estudar e aprender sobre os temas, com responsabilidade de escrever algo que todos vão ler”, enfatiza. O informativo é distribuído nas reuniões de pais.

Os textos informam sobre projetos das escolas, comportamento, práticas no campo, além de entrevista com profissionais que passaram pela colégio e moradores da região.

Primeiros passos - Lecionando para o primeiro e segundo ano, Luciane Souza afirma que o começo da alfabetização exige mais dos alunos que vivem no campo. “Por não terem tido muito contato com gibis, revistas, livros”, conta a professora, interrompida a todo instante pelos pequenos estudantes, ávidos em saber se estavam acertando a lição.

Na sala decorada com alfabeto e calendários coloridos, Miguel, de 6 anos, conta que já sabe escrever o nome e que o recreio é a hora preferida. A explicação é justa. “Porque é a hora de brincar”.

Ezequiel aprendeu a tocar violão e já compôs cinco músicas. (Foto: João Garrigó)

Frutos da boa vontade – As parcerias também permitiram que uma horta brotasse nos fundos da escola. Nos canteiros, crescem rabanetes, alfaces, cebolinhas que vão dar cores e nutrição à merenda dos estudantes.

As mudas e orientação vieram da Sedesc (Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econômico), já o alambrado em torno da plantação é uma parceria com o Rotary Clube de Campo Grande. Em breve, os viveiros também terão plantas medicinais.

Os alunos também são responsáveis por projeto de coleta seletiva. O lixo orgânico vira adubo por meio da compostagem. Enquanto papéis, vidros e latas são vendidos e o dinheiro revertido para confraternização de fim de ano.

Nascida da boa vontade, a oficina de violão também dá frutos. “Quando fiquei sabendo da aula de violão , pensei, vou ser o primeiro a fazer”, conta Ezequiel Hortencia Vieira dos Santos, de 14 anos.

O instrumento musical agora é o parceiro para compor músicas. O desacerto de uma paixão adolescente virou “Cansei de ser bobo”, uma das cinco musicas composta por Ezequiel.

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