Comportamento

Sem voz, pai não disse adeus antes de morrer, mas filho não desiste da despedida

Paula Maciulevicius | 15/12/2015 06:23
Isabelly, viúva, procurava o terceiro contato com o marido assassinado em 2014. (Fotos: Paula Maciulevicius)
Isabelly, viúva, procurava o terceiro contato com o marido assassinado em 2014. (Fotos: Paula Maciulevicius)

Seu Benedito se foi aos 58 anos, depois que o calendário viu passar 13 meses de luta pela vida. Um câncer no cérebro lhe tirou a fala nos últimos momentos e ele partiu sem se despedir. O que ficou no filho foi um sentimento de que o pai não conseguiu dizer tudo o que queria. Uma de tantas histórias que nos mostram como é difícil lidar com a morte e que talvez o espiritismo seja um caminho e a psicografia, um dos maiores alentos.

Luiz Ricardo Coutinho já era espírita antes do câncer bater à porta. Dois meses depois de enterrar o pai, ele sente que precisa saber quais eram as últimas palavras. No final de semana, Luiz Ricardo aproveitou a vinda de um médium de Uberaba, Luiz Cláudio, à Associação Espírita Irmão Marcos, para tentar um contato e dar a chance de o pai falar.

"Ele sempre foi uma pessoa que estruturou muito bem tudo: família e negócios. Como a doença tirou a fala dele de uma hora para outra, depois ele não tentou mais se comunicar por outros meios", descreve o filho. O motivo da visita era um só: saber se o pai está em paz com tudo o que ele deixou. "Se ele precisava expressar alguma coisa que não expressou em vida. Venho mais pela sensação de ele não ter falado tudo o que tinha para falar", resume.

Luiz Ricardo, filho que procurava saber as últimas palavras não ditas pelo pai.

Não é só pela idade que o filho lamenta ter se despedido tão cedo do pai, como também de tudo o que ficou ainda a ser feito. O pai era empreendedor, um cara extremamente família e que deixou nos filhos os valores que Luiz Ricardo quer manter. "É uma forma de estar mais próximo. A gente vem na esperança de conseguir ter notícias".

Ao chegar ao centro espírita, Luiz Ricardo e outras dezenas de pessoas preenchiam uma ficha, com nome, nome do parente que morreu, data de nascimento e de partida, além do grau de parentesco. Depois de recolher as fichas, todos passavam por uma breve entrevista com o médium. Para então receber ou não a comunicação por escrito durante a programação à noite.

A psicografia é a comunicação daqueles que se foram, mas são, segundo um dos dirigentes do centro, Ricardo Gomes, autorizados a terem condições de se comunicarem. "Para que você receba uma carta tem que preencher alguns requisitos, o primeiro deles é a necessidade. O espírito vem por algum motivo", explica Ricardo.

Não há um limite para a vontade de querer continuar o contato. Há quem se dê por satisfeito com uma carta e há quem busque incessantemente pelo diálogo. Luiz Ricardo se bastava em saber se o pai estava confortável com o rumo que as coisas tomaram. Mas diferente dele, têm muitos que buscam por várias vezes.

Isabelly Rezende, de 28 anos, já recebeu duas vezes a escrita do marido, assassinado pelo vizinho no ano passado. "A gente busca notícia para saber se a pessoa está bem e como está do outro lado, porque acreditamos que realmente existe vida após a morte", sustenta.

A jovem foi até Uberaba, roteiro do legado de Chico Xavier, por duas vezes. Em novembro de 2014 e agora, em agosto. No coração, a visita do médium do final de semana trazia esperança e o alento de saber como estava o marido. "É uma forma de acalmar o nosso coração, porque a saudade fica e sempre vai ficar", justifica. Espírita desde criança, ela sempre teve fé nas psicografias e no desespero, apostou tudo o que podia de que iria receber contato.

"Não é assim: a gente quer e pronto, tem que ter muita fé e saber que uma hora vem. Se não viesse antes, eu ia voltar e ficar tentando até conseguir", conta.

Foram 12 anos juntos e uma vida que não terminou. "Eu preciso saber, eu sei que a vida após a morte existe, como ele está? Eu sei que está bem e acredito muito que um dia a gente vai se reencontrar e todas as vezes que eu tiver oportunidade, um caminho, eu vou buscar", frisa a esposa.

As cartas a ajudam a seguir em frente e numa delas, Isabelly acredita que o próprio marido disse isso: que ela precisa seguir em frente e que a vida continua. "Com os olhos físicos não dá para a gente se ver mais, mas eu tenho e sinto a presença dele. E se ele estiver bem, eu também vou estar", finaliza.

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Médium Luiz Cláudio com as fichas em mãos em palestra, explicando sobre as psicografias.
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