Comportamento

Maior desejo de grávida de Miriam foi de comer maxixe, outro sonho não realizado

Paula Maciulevicius | 03/04/2017 07:36
O uniforme alaranjado é uma das poucas cores que Emanuelle reconhece da grade para dentro. (Foto: Alcides Neto)
O uniforme alaranjado é uma das poucas cores que Emanuelle reconhece da grade para dentro. (Foto: Alcides Neto)

"A cadeia mais sofrida é a das mulheres. Os homens tiram, desculpa o palavreado, gozando. Aqui é cadeia mesmo, é tranca". A definição vem de alguém que fala com propriedade sobre estar entre grades. Na terceira prisão, Miriam viveu essa completamente diferente. Viu a barriga crescer lá dentro e a bolsa estourar enquanto, sentada, fazia crochê.

"Foi minha primeira gravidez aqui. É uma sensação ruim, de ter vontade de comer as coisas e não pode. De querer comprar as coisas para o neném e não pode. Não tenho visitas, ninguém que venha trazer, então dependo de doações", conta Miriam Silva de Oliveira.

O uniforme alaranjado das internas e a camiseta preta dos agentes são as únicas cores de roupa que a filha, Emanuelle Vitória, reconhece. Os rostos, também. Não tem novidade para a menina que vive encarcerada com a mãe desde que nasceu, há três meses. 

Para sustentar o vício, mãe passou a fazer o "corre" e viver pelas ruas, até que caiu pela terceira vez por tráfico de drogas. (Foto: Alcides Neto)

Miriam é usuária de drogas há 22 anos e Emanuelle, sua sexta filha. Número que ela informa aos risos. Para sustentar o vício, passou a fazer o "corre" e viver pelas ruas, até que caiu pela terceira vez por tráfico de drogas.

"Eu estava vendendo, mas não era traficante. Caí com 11 gramas de droga e peguei essa condena, porque o juiz pediu exame toxicológico e mesmo eu usando 22 anos, o médico disse que eu não era usuária", contextualiza. 

São três anos que ela tem pela frente para cumprir de pena. Os cinco filhos estão sob os cuidados da avó paterna. Emanuelle é de pai diferente deles e a mãe já sabia de sua existência quando chegou à prisão. 

A menina nasceu prematura. Aos 7 meses, a bolsa de Miriam estourou e não houve tempo dela realizar um dos desejos que teve durante a gestação. O organismo da mãe desconhecia o que era estar entre grades e não ter nem a liberdade nem para comer o que se quer. "Eu tive muita daquelas vontades e de comer maxixe. Inclusive a mãe de uma das detentas até trouxe, mas não deu tempo. Eu fui ganhar neném e ela nasceu com a manchinha no braço, é do maxixe", brinca.

Não há visitas nem do pai da criança. A família dela também nunca veio. (Foto: Alcides Neto)

Emanuelle nasceu de cesárea e só revelou ser uma menina ali. Nos sete meses de gestação, a mãe não chegou a fazer nenhuma ultrassonografia para saber o sexo e mesmo sendo a filha número seis, a sensação é, como descreve Miriam, de ser mãe pela primeira vez.

"Foi um pouco mais diferente, não que eu não amo meus filhos, amo igual. Mas com ela eu já botei na cabeça que ia parar de ser usuária e consegui, até hoje estou firme", jura de pé junto.

Não há visitas nem do pai da criança. A família dela também nunca veio. "Me afastei deles por vergonha. Eu não fumava nem cigarro na frente do meu pai, em respeito a ele. E não quero que ele venha me ver, porque quem errou fui eu e eu que tenho que pagar".

A menina que mistura vitória com "Deus conosco" tem um rosto lindo, olhos e boquinha que parecem ter sido desenhados. No presídio, atribui-se a um milagre a criança ter nascido saudável, visto que a mãe vivia nas ruas.

Durante o dia, a menina fica na creche e vê a mãe na hora da mamadeira. À noite, dorme junto das outras duas crianças, na "jega", dentro da cela. O crochê que ela faz na prisão rendeu ao neném uma bolsinha de crochê. 

"Pela lei eu tenho direito de ficar com ela mais seis meses. Mas eu creio, não sei o que Deus está preparando para a minha vida, mas confio nele", diz Miriam.

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