Comportamento

Esposa de Manoel de Barros, dona Estela chega de Fusca e sem cola para votar

Paula Maciulevicius | 05/10/2014 11:00
A figura da senhorinha chama atenção pelo semblante de avó e mais ainda pelo peso do sobrenome. (Foto: Paula Maciulevicius)
A figura da senhorinha chama atenção pelo semblante de avó e mais ainda pelo peso do sobrenome. (Foto: Paula Maciulevicius)

Pequenina, curvadinha e com um sorriso estampado no rosto. A descida da rampa da escola Lúcia Martins Coelho, no Bairro Jardim dos Estados, em Campo Grande, era feita a passinhos curtos e vagarosos, com a ajuda do cuidador. A figura da senhorinha chama atenção pelo semblante de avó e mais ainda pelo peso do sobrenome. Dona Estela de Barros foi votar nesta manhã, talvez por ela e pelo poeta, Manoel, com quem divide uma vida inteira.

Os pés calçavam um tênis preto, a calça jeans parecia larguinha no corpo tão miudinho. A camisa azul com estampa de flores contrastava com a pele tão branca. As palavras saem mais rápidas que os passos. Ela educadamente ri e diz "mas eu já falei". A resposta afirmava que esta não foi e nem seria a única entrevista do dia. 

Enquanto tantos podem correr para as urnas, a força de vontade dela é inversamente proporcional à velocidade da caminhada. "Faço questão, porque sou brasileira", responde. Dona Estela está com 93 anos.

Dona Estela de Barros foi votar nesta manhã, talvez por ela e pelo poeta, Manoel. (Foto: Paula Maciulevicius)

Sobre o poeta, a resposta de que ele "está bem" vem só do cuidador. Da boca dela só sai um sorriso. As frases foram sendo repetidas com gentileza à medida em que outros eleitores cruzavam o caminho.

Mas é público que Manoel não vive nada bem. Não anda mais, não escreve, se alimenta por sonda há meses e, segundo amigos, desistiu da vida. 

Quando digo que Estela é o mais próximo que vou chegar do poeta, ela repete em voz alta e se convence a me deixar acompanhá-la.

O carro parecia longe, estacionado do lado da Rua Da Paz do colégio, um Fusquinha amarelo a aguardava. O cuidador era quem dirigia. "Já valeu a nossa caminhada dona Estela", dizia como quem sabe que ir votar exigia um pouco mais.

Quando percebe que continuo a acompanhar e a perguntar, solta: "você está tentando arrancar de mim o que eu não posso falar", brinca. "O quê, o voto? Não, mas isso nem eu posso perguntar", respondo.

Sem nada nas mãos, questiono onde esteve a "colinha" com os números dos candidatos. "Colinha? Não, está tudo na cabeça", sinaliza.

Voto dado, entrevista feita. Dona Estela entra no carro, acena e vai embora.

Voto dado, entrevista feita. Dona Estela entra no fusquinha, acena e vai embora. (Foto: Paula Maciulevicius)
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