Comportamento

Em casa de “500 cruzeiros”, dona Olímpia se divide entre compotas e plantas

Ela tem 83 anos, mas é toda independente e acorda cedo para realizar os afazeres domésticos, cuidar do jardim e fazer doces

Alana Portela | 13/06/2019 07:27
Olímpia acorda cedo todos os dias para trabalhar em casa e carpir o quintal (Foto: Simão Nogueira)
Olímpia acorda cedo todos os dias para trabalhar em casa e carpir o quintal (Foto: Simão Nogueira)

Independência e persistência definem dona Olímpia Silva que aos 83 anos se divide entre compotas e plantas, no bairro Tiradentes de Campo Grande. Às 6h manhã já está de pé para limpar a casa, lavar roupa, fazer sabão, plantar e regar, cozinhar, cuidar do cachorro Bob e ter tempo para assistir suas novelinhas. Sem tempo ruim, ela sempre “batalhou” como empregada doméstica para sustentar quatro filhos, e foi com o suor do trabalho que conseguiu comprar a casa onde mora por 500 cruzeiros na década de 90.

“Vim de Dourados em 1991, quando cheguei em Campo Grande aluguei casa. Trabalhei de empregada doméstica por 35 anos e fui guardando dinheiro, até que eu e meu filho e compramos esse terreno por 500 cruzeiros. Levou cerca de dois anos para comprarmos o local. Um rapaz me trouxe aqui para olhar, era tudo cercado de arame e depois fomos no banco e paguei ele na hora. Erguemos a residência e fui comprando coisas usadas, um senhor me vendeu portas e janelas a prestação. Devagarzinho fomos arrumando”, relatou dona Olímpia.

Olímpia cuida das plantas do jardim (Foto: Simão Nogueira)

Ela é viúva, perdeu o marido Sebastião em 1992, após se mudar para Campo Grande. Eles faziam planos de chegar na Capital e conseguir comprar uma casinha para morarem e fazer uma lavoura para plantar. No entanto, a vida resolveu separar o casal.

“Ele saiu com o amigo dele, estavam indo de carro para Dourados aí no caminho apareceu outro um motorista bêbado e causou um acidente. Morreu na hora e quando soube fiquei triste pensando como iria criar meus filhos. Uma amiga minha me falou para levantar a cabeça porque iria conseguir e quatro dias depois, fui trabalhar. Nessa época, minha patroa me pegava chorando e perguntava o que era, mas tinha vergonha de falar”, recordou Olímpia.

Ela é independente e conta sua história de vida (Foto: Simão Nogueira)

Após o falecimento do marido, dona Olímpia resolveu seguir em frente e continuar com os planos que haviam feito. Ela não quis se casar novamente e passou mexer com plantas como forma de terapia.

O terreno onde mora tem 12x30 metros quadrados, nesse espaço ela deu início as suas plantações. No seu pomar tem de tudo um pouco, abóbora, abacaxi, hortelã, romã, cara, cajá-manga, laranja, mexerica, goiaba, pimenta, batata-doce, etc.

A casa onde mora é pequena, mas ajeitada e contém um quarto, sala, cozinha, dois banheiros e a varanda onde dona Olímpia passa a maior parte do tempo. Os azulejos são brancos e ela faz questão de varrer e passar pano todos os dias. Está tão acostumada, que faz a limpeza em menos de uma hora.

Há cerca de 12 anos mandou construir um fogão a lenha no quintal para cozinhar a “moda antiga”. “Morei em fazenda com meus pais, lá cozinhava no fogão a lenha. Fui conhecer o gás aqui em Campo Grande”, contou. “Aqui sou muito conhecida, e as lenhas são meus amigos que trazem. Me ajudam muito”, complementou.

Nesta semana, Olímpia fez doce de casca de laranja e vende por R$ 15,00. “Esse doce é preparado com oito dias, porque tem que deixar de molho a casca. Tem que trocar a água umas três vezes por dia e uso dois quilos e meio de açúcar para fazer o doce. Também faço doce de abóbora, mamão”, disse. Após ficarem prontas, as compotas são guardadas na geladeira. Ela ainda faz conserva de pimenta para vender por R$ 3,00.

No fogão a lenha no quintal de sua casa, ela faz comida, doces e sabão para vender (Foto: Simão Nogueira)
Ela lava roupa todos os dias (Foto: Simão Nogueira)
Para ela, cuidar das plantas é uma forma de terapia (Foto: Simão Nogueira)

Rotina - A rotina de dona Olímpia continua puxada, ela acorda às 6h da manhã para tomar o precioso cafezinho e arrumar a casa. Depois começa a lavar as roupas, molhar as plantas. Pega a enxada para carpir o terreno e limpar os canteiros, faz almoço ao ar livre, come e deita no sofá da sala para descansar por alguns minutos. A tarde, rega as plantas novamente por conta do calor, lava louças, faz sabão de álcool e vende por R$ 2,00. A janta é preparada cedo, para que possa se alimentar às 16h30 sem falta.

“Meus pais me ensinaram a jantar cedo para não ter problema com o intestino e assim faço até hoje. Aqui, às vezes, preparo bolo de todos os tipos e pão. Assisto as novelas, mas não durmo tarde porque no outro dia tem mais”, disse.

O jardim de tem várias frutas que ela usa para fazer doces (Foto: Simão Nogueira)
Olímpia guarda as compotas na geladeira de sua casa (Foto: Simão Nogueira)

Dinheiro contado - O dinheiro de Olímpia é contado, não sobra e nem falta, por isso ela economiza ao máximo. As roupas que usa são compradas em brechós. “São usadas e pago R$ 5,00. Compro, lavo e passo aí fica boa para vestir. Tenho que pagar luz, água e comprar remédios por conta da saúde. Fiz uma cirurgia nos olhos e preciso passar um colírio especial que é caro”, relatou. “Já fiz muitos trabalhos pra fora, mas hoje por conta da minha visão faço mais coisas em casa. Tenho que pagar ainda o plano de saúde, a Pax e ainda comprar o meu feijãozinho com arroz. O fogão a lenha ajuda a economizar gás”, completou.

Rastelos, enxadas e foice são utilizados por Olímpia na limpeza do quintal (Foto: Simão Nogueira)
A dona de casa fez um canteiro usando telhas para proteger as plantas (Foto: Simão Nogueira)

Lembranças e saudade - Olímpia ficou viúva pouco depois de vir morar na Capital, mas não esquece do amado e guarda muitas lembranças. Ela se casou com Sebastião em 1954, em Dourados. Na época, estava com 18 anos enquanto o amado tinha 36. “Me ajudava a lavar as roupas dos homens, lavava meus pés todos os dias com água quente. Até hoje sofro de saudade dele”, afirmou com um olhar meio triste.

Olímpia e Sebastião se casaram em 1954 em Dourados (Foto: Simão Nogueira)
Olímpia tinha 18 anos e Sebastião 36 quando se casaram (Foto: Simão Nogueira)

O relacionamento dos dois começou quando ele visitava a casa de seus pais de Olímpia e decidiu pedir a sua mão em casamento. “Ele ia na minha casa, montado em uma mula bonita. Trabalhava para fazendeiros e eu sempre quis me casar com um homem mais velho. Meus pais aceitaram o pedido, mas naquele tempo só podia pegar na mão um do outro na hora de assinar os papéis. Depois que nos casamos, mudamos para Rondônia”, lembrou.

Na região norte do país, o casal ficou por oito anos até que voltou para Dourados e em seguida, veio para Campo Grande. “Queríamos comprar uma casa aqui, ele gostava de plantar milho, mandioca. Tenho muitas recordações, a carteira de trabalho dele ainda está guardada comigo, junto com uma cruz que gostava muito. São lembranças dele, não vou jogar fora”, finalizou.

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Simples e animada, dona Olímpia atendeu a equipe de reportagem (Foto: Simão Nogueira)
(Foto: Simão Nogueira)
(Foto: Simão Nogueira)
(Foto: Simão Nogueira)
(Foto: Simão Nogueira)
(Foto: Simão Nogueira)
(Foto: Simão Nogueira)
(Foto: Simão Nogueira)
(Foto: Simão Nogueira)
(Foto: Simão Nogueira)
(Foto: Simão Nogueira)
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