Comportamento

Avó que passou dos 100 anos pede saúde de presente por já ter um bocado de coisa

Paula Maciulevicius | 07/07/2014 06:34
O bolo, de mentira, tinha a velinha que indicava quantos anos a mocinha da casa estava fazendo: 101. (Fotos: Marcelo Victor)
O bolo, de mentira, tinha a velinha que indicava quantos anos a mocinha da casa estava fazendo: 101. (Fotos: Marcelo Victor)

Centenária de verdade, de registro que não tardou a ser feito. A data de nascimento é 01/07/1913. Com 101 anos completos na última terça-feira, dona Durvalina Pereira Borges comemorou mais um ano de vida com a família neste domingo. Primeiro na missa da igreja São Francisco e depois em um café da manhã na casa da filha mais velha.

A decoração era cor de rosa e com estampas florais nas toalhas de mesa. O bolo, de mentira, tinha a velinha que indicava quantos anos a mocinha da casa estava fazendo: 101. Nem ela mesma acredita ter chegado e passado dos 100. Lúcida, com boa saúde, os únicos pormenores é a audição e umas dores que volta e meia ela sente. Também, pudera, o corpo já aguentou um século de vida.

Dos cinco filhos, dois ela já enterrou. As gerações seguintes totalizam a casa cheia. São 13 netos e 12 bisnetos, por enquanto. Nas contas dela, dona Durvalina não chega ao mesmo número, mas não tem um único descendente que ela não reconheça.

Lúcida, com boa saúde, os únicos pormenores é a audição e umas dores que volta e meia ela sente.

Baiana da cidade de Riachão das Neves, chegou a Mato Grosso do Sul faz quatro décadas. “A sorte é que manda no destino, o destino é quem manda. Eu nunca tive vontade de sair da minha terra, que é tão longe, mas os parentes do meu marido já moravam aqui e eles chamavam, chamavam”, descreve.

Os pedidos chegavam por carta e foram convincentes o suficiente para que ele decidisse tentar a vida por aqui. Mas como dona Durvalina mesmo diz, o destino é quem manda. “Ele viveu muito pouco tempo aqui, morreu me deixando os cinco filhos. O mais velho tinha 18 anos”, recorda. E o desejo dele foi realizado só por ela e os filhos.

“Mas o sofrimento foi maior. Perdi o marido e dois filhos”, contabiliza como quem quer dizer que a vida não teve dó.

Para conversar eu tenho que me aproximar do ouvido, ou ela entende lendo os lábios. Tive esta impressão porque às vezes ela quis falar de frente a frente. “A saúde completa eu não tenho não. Eu estou velha, não enxergo quase nada. Já fiquei surda. Esse aparelho, ah esse aparelho é o mesmo que nada, mas está bom”, brinca. As dores no corpo não chegam a incomodá-la tanto, mas volta e meia aparecem e ela precisa recorrer ao médico. “É de vez em quando, mas daqui a pouco aparece de novo”...

A centenária mora com o filho mais velho e o único que não se casou, junto de uma sobrinha. Já foi muito para a beira do fogão, mas hoje não deixam mais. O motivo é o receio da família de ela lidar com fogo. Quer queira, quer não, dona Durvalina não tem mais o mesmo reflexo de antes e pode, mesmo sem querer, se queimar.

No meio da comemoração de 101 anos, a pergunta que fica é se ela conhece mais alguém assim. A resposta é imediata e com sotaque ainda arrastado. “Conheço não. Da minha família mesmo já morreram quase tudo. Nunca tive ninguém que chegasse a todo esse tempo”, diz. A lucidez é, em parte, vista também pela consciência que ela tem, do privilégio de chegar a essa idade.

A lucidez é, em parte, vista também pela consciência que ela tem, do privilégio de chegar a essa idade.

A conversa rende para mais de hora e eu tento descobrir o que será o segredo da longevidade. Descubro que talvez seja uma vida de fé e de cachimbo. Todo domingo, faça chuva ou faça sol, ela vai à missa das 8h. De táxi, com uma das filhas e volta de carona com alguma ‘irmã’ da igreja. Já sobre o cachimbo... É que o dia dela não começa se não vier café e fumo.

“Fumo cachimbo, comecei a fumar tinha 13 anos”, conta. A rotina ainda é de levantar cedo, mas nem tanto. Depois de uma certa idade ela resolveu usufruir do luxo e deixou de acordar às 5h da manhã. “Antes eu levantava essa hora para dar conta do trabalho. Agora só às 7h, tem que deixar para os outros não é?” brinca.

A casa em que ela vive é coberta de plantas. Só de pés de feijão, por exemplo, são 16 plantados por ela mesma. “Toda vida eu gostei muito de plantar”. É ela sozinha que pega no batente da enxada.

Magrinha, miudinha, de vestido azul estampado e sandalinha dourada, de salto, dona Durvalina começa a receber os presentes. É hora de descobrir o que ganha uma centenária. E o primeiro item a ser aberto é um telefone. Uma das netas explica que é porque ela caiu estes dias ao ir atender o aparelho com fio. Para evitar que a queda se repita, é a vez de usar um telefone sem fio.

Depois chegam produtos de beleza, cremes, perfumes e colônias. É que a bisavó é muito vaidosa e se mantém perfumada e de unhas feitas até mesmo na hora de aparar o jardim.

Ela não vê a idade como limitação, não reclama do que já viveu e nem do que já assistiu nestes anos. Uma das filhas tem a saúde bem delicada e mal sai de casa. Ao contrário da centenária. “Eu não sei se acreditam quantos anos eu tenho, mas é verdade e o que eu quero para mim é saúde. Para mim e minha família. Deus me dando isso pelos dias que ele ainda tiver que me dar, está bom”, resume.

Sobre o que desejaria ganhar de presente, ela ri e diz que já tem mais que o suficiente. “Qualquer coisa que a pessoa quiser dar de bom coração. Não sei o que eu quero, porque graças a Deus eu tenho um bocadinho de coisa lá”.

Todo ano a família realiza a festa de aniversário para festejar e por acreditar que este talvez seja o último bolo. Mas dona Durvalina vem provando o contrário e que venham os 102 anos.

Todo ano a família realiza a festa de aniversário para festejar e por acreditar que este talvez seja o último bolo. Mas dona Durvalina vem provando o contrário.
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