Artes

Único espetáculo indígena de mostra levou dor e ancestralidade para praça

Produzido pelo grupo Guarani Kaiowá Liberdade PKR, “Gritaram-me Bugra” foi apresentado neste sábado

Aletheya Alves | 26/06/2022 08:20
Espetáculo “Gritaram-me Bugra" foi apresentado pelo grupo Guarani Kaiowá Liberdade PKR. (Foto: Kísie Ainoã)
Espetáculo “Gritaram-me Bugra" foi apresentado pelo grupo Guarani Kaiowá Liberdade PKR. (Foto: Kísie Ainoã)

Integrando a Mostra Sul-mato-grossense de Teatro e Circo Boca de Cena, o único espetáculo indígena da programação, “Gritaram-me Bugra”, levou reflexões sobre dor, cultura e ancestralidade para a Praça Ary Coelho neste sábado (25). Produzido e interpretado pelo grupo Guarani Kaiowá Liberdade PKR (Pa’i Kuara Rendy), da Aldeia Amambai, a apresentação ainda trouxe indignação sobre o confronto na região em que dois indígenas morreram. 

Por cerca de 30 minutos e com público atento durante toda a apresentação, o espetáculo une uma mescla de reflexões e sentimentos a partir da visão de uma mulher indígena Guarani Kaiowá. Na descrição escrita pelo grupo, a ideia é discutir tanto sobre o preconceito e discriminação quando sobre o orgulho da etnia e de manter a cultura viva. 

Integrando o Boca de Cena, o espetáculo foi parte das 21 apresentações gratuitas oferecidas na sexta-feira (24) e sábado. Devido ao evento ser uma reunião de diversos grupos, questionamos em nossa enquete se o público sente falta de mais espetáculos gratuitos, como o Boca de Cena, em Campo Grande.

Com resultados quase equiparados, 49% dos leitores disseram que gostariam de mais apresentações teatrais gratuitas por aqui, enquanto 51% afirmaram que não. 

Integrantes do grupo são indígenas da aldeia Amambai. (Foto: Kísie Ainoã)

Composto por duas etapas, a apresentação começou com um manifesto intenso sobre as dores vividas tanto pelas mulheres quanto pela população indígena como um todo. No segundo momento, os integrantes focam tanto na valorização da cultura quanto do preconceito.

“É muito difícil estar aqui, mas também muito importante. É uma dor muito grande chegar aqui e saber do ocorrido, muito triste. Estamos aqui de luto”. Emocionado, o escritor e diretor da peça “Gritaram-me Bugra”, Duadino Martines, de 35 anos, contou que o grupo foi criado em 2015, mas ainda hoje os objetivos dos espetáculos continuam os mesmos. 

Espetáculo levou reflexões sobre dor, ancestralidade e preconceito. (Foto: Kísie Ainoã)

Responsável por falar sobre as discussões levantadas pela peça, Duadino explicou que o objetivo é levar reflexões sobre o que acontece tanto dentro das aldeias quanto fora delas. 

Nós queremos falar sobre os direitos da mulher e também do nosso povo. Está sendo um desafio trazer esse espetáculo hoje, que mostra nossa cultura, porque é uma questão de representatividade, de ocupar os espaços, explica Duadino.

Para tanto, o diretor detalha que durante os 30 minutos, através de uma narrativa encenada, um manifesto é declamado sobre o preconceito nas ruas, a importância da terra e acusações de que os povos originários são invasores.

Espetáculo durou cerca de 30 minutos e deixou o público cativado. (Foto: Kísie Ainoã)

Ainda em 2015, o grupo foi criado a partir de discussões sobre a importância de apresentar a realidade dos integrantes, de acordo com o diretor. “Nós queremos mostrar as questões que vivemos no Estado, desde a desvalorização até o preconceito. Precisamos levar essas questões para o público”, diz. 

Especificamente sobre o espetáculo ocorrer justamente no período de conflito entre indígenas Guarani Kaiowá, fazendeiros e polícia, Duadino pontuou que a dor ficou ainda mais forte, assim como a percepção de importância para a resistência. 

Além do espetáculo, integrantes do público e de coletivos que também estavam na Praça Ary Coelho pediram por justiça e investigação do conflito em Amambai. Através de cartazes, fizeram um momento de respeito aos povos indígenas antes da peça. 

Conflito em Amambai - Classificado como “Massacre de Guapoy” pela Grande Assembleia Aty Guassu Guarani e Kaiowá, o confronto entre indígenas e policiais do BPChoque (Batalhão do Policiamento de Choque) ocorreu em Amambai - a 351 quilômetros de Campo Grande. 

Até o momento, as informações são de que dos sete indígenas feridos, três foram liberados. Além deles, outros dois indígenas morreram durante o confronto, sendo um homem identificado como Vito Fernandes e um adolescente de 13 anos identificado como Paulino. 

Durante o conflito, três policiais do Batalhão de Choque, também ficaram feridos. Os nomes não foram informados, mas eles têm 41, 38 e 26 anos, todos atingidos de raspão. 

O confronto aconteceu na manhã de ontem, na Fazenda Borda da Mata, em Amambai. O Cimi (Conselho Indigenista Missionário) contesta a presença da PM em situação de competência da PF (Polícia Federal).

A PM (Polícia Militar) foi acionada na quinta-feira à noite e, segundo titular da Sejusp (Secretaria Estadual de Justiça e Segurança Pública), Antônio Carlos Videira, para conter danos ao patrimônio e grave ameaça à vida que estaria acontecendo na região, crimes de atribuição da polícia local. Por conta da proximidade com a aldeia, optou-se em mandar o BPChoque na manhã seguinte. 

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