Artes

Buscando o próprio lugar no mundo, Paulo José fez das experiências um livro

O livro “Espírito Perdido”, é ambientado nos primórdios da humanidade entre deuses e homens em um universo repleto de magia.

Kimberly Teodoro | 25/06/2019 10:19
Autor campo-grandense Paulo José Maia se aventura pelo reino da literatura-fantástica em sua primeira obra  (Foto: Estúdio Vollkopf)
Autor campo-grandense Paulo José Maia se aventura pelo reino da literatura-fantástica em sua primeira obra (Foto: Estúdio Vollkopf)

Buscar o próprio lugar no mundo fez com que o escritor campo-grandense Paulo José Maia encontrasse Keana, personagem que mais tarde se tornou na protagonista do livro “Espírito Perdido”, primeiro volume da série “Finita Eternidade”. A narrativa nasceu de maneira despretensiosa e ganhou vida no mês de maio em uma edição com 440 páginas repletas de ilustrações que levam o leitor até Divagar, um reino habitado por deuses que, sem nunca terem enfrentado a morte, vivem em um paraíso dourado às custas dos mortais.

Formado em Rádio e TV pela Fundação Armando Álvares Penteado, em São Paulo, a carreira de Paulo José sempre foi voltado para o audiovisual, enquanto a relação com a escrita sempre foi paralela e encarada como um hobby. Permitir que outras pessoas lessem os manuscritos? “Só se fosse algum trabalho de escola ou roteiro da universidade”, brinca.

Criado em um ambiente que o estimulou a conhecer o mundo, Paulo José resume a própria história como um caminho de “idas e vindas” que o levaram a morar fora durante 4 anos, principalmente depois de concluir a universidade e buscar uma especialização em em em roteiro cinematográfico pela NYU (New York University), em 2009, quando passou o período mais longo longe de casa. Época em que, apesar de habituado à vida em outro país, sentia o coração pesar com a saudade dos amigos e da família deixados na terra natal.

“A readaptação acabou sendo muito difícil para mim, eu estava com uma cabeça muito diferente, eu me sentia muito fora d’água. Foi um momento em que fiquei muito solitário”. Foi quando a conversa com uma amiga da faculdade deu início a um ciclo de organização de ideias ainda maior que o retorno ao lar, transformando a sugestão de usar as palavras para colocar os sentimentos para fora em um processo que durou cinco anos e resultou em uma história com personagens com questões parecidas com as que o autor viva no momento, mas que também traziam identificação com a vivência de outras pessoas e contextos sociais muito presentes no cotidiano.

Além na narrativa, o livro conta ilustraçõe, mapas e descrição de personagens que oscilam entre registros históricos e a liberdade poética do autor (Ilustração: Reprodução/Nico Lassale)
Além de capital de Paradis, Lúmen é também centro político e econômico de Divagar. (Ilustração: Reprodução/Nico Lassale)

“Eu só queria colocar para fora, eu achava que eu estava escrevendo ali e talvez não interessasse a ninguém. Eu estava escrevendo para mim, uma história que eu queria ler. A medida que a coisa foi tomando corpo, fui mostrando para algumas pessoas eu tive um feedback de gente que achava interessante, que nunca tinha visto nada parecido, que gostava dos personagens e se identificava com eles, gente que já viveu algumas situações parecidas. A medida que comecei a alcançar leitores, contar uma história que talvez interessasse alguém a ler, foi quando comecei a pensar que o material poderia vir a público”.

Nesse momento, a personagem Keana tomou forma, uma adolescente de 15 anos em busca das origens que deixou de ser alguém com quem o autor conversava, para contar a própria história, como se os papéis estivessem invertidos e desta vez, que passou a ouvir foi Paulo José. Ouvir e transcrever para o resto do mundo.

Ambientado na pré-história, o livro descarta a fórmula dos grandes sucessos da literatura-fantástica, gênero do qual faz parte. Desarmado de “espadas e dragões” o autor encara de frente uma aventura repleta de magia, ciência e referências históricas, que além da imaginação do leitor, também busca despertar a curiosidade para um terreno pouco explorado e período da história do qual se sabe tão pouco.

Sem desdenhar da fantasia clássica, Paulo José conta que a narrativa ganhou vida do desejo de contar uma história diferente daquela que “todo mundo já contou”. Para ele, bruxas e dragões fazem parte de um sistema capaz de enriquecer a narrativa, mas que de tão usados, acabaram como “descrições de autores diferentes em um lugar novo”.

Keana, persongem principal com características e trajes criados com base no período histórico do livro (Ilustração: Reprodução/Nico Lassale)

Escrito originalmente em inglês, língua de expressão criativa do autor, o ebook foi lançado na plataforma digital na Amazon em Abril deste ano e ganhou edição impressa e traduzida para o português em Maio, concluindo esse processo de volta para casa e levando Paulo José a encarar o desafio da escrita de frente.

Curiosamente, mesmo falando as duas línguas, Paulo José decidiu colocar uma pequena distância durante a tradução. A publicação em português é assinada por Robson Falcheti Peixoto, que define a experiência como inusitada “para alguém acostumado a traduzir autores que jamais encontra para cafés e que não entendem o português”. O autor explica que ter acompanhado de perto o trabalho de Robson, que teve carta branca para trazer o universo de Divagar para o Brasil.

“Cheguei a tentar traduzir, mas acabei revisitando a história e mudando alguns trechos e diálogos quando coloquei as duas versões lado a lado, vi histórias diferentes. É também uma questão de respeito ao leitor, se você publica uma história e quer que as pessoas leiam, eu não queria que os leitores do meu país tivessem uma experiência que fosse diferente do texto original. Fiquei muito feliz com o resultado, achei que a poética do livro em português é tão boa quanto em inglês. É como se alguém contasse para mim uma história que eu criei. É uma sensação engraçada de contar uma história e ouvir a outra pessoa te contando como se acontecesse com ela”.

Lançamento da edição brasileira aconteceu no mês de Maio, aqui em Campo Grande (Foto: Estúdio Vollkopf)

Além da tradução de Robson, o livro também contou com a colaboração de amigos e profissionais que têm uma relação de intimidade com a obra, como a amiga e leitora Tainá Bandeira, “dona” da primeira opinião sobre o livro. A geógrafa Luana Chico, responsável pela pesquisa período do Pleistoceno, que deu a ambientação norteadora da história. O arquiteto e estilista Paulo Bellé, “culpado” pela preservação dos traços e vestimentas dos personagens. A editora Amy Bennet, que transformou a versão de 800 páginas do original na obra que hoje se encontra nas livrarias. A designer Carol Melo, responsável pela formatação e estilo do projeto. O ilustrador Nico Lassalle, que deu vida aos personagens com os traços da ponta do lápis. Lúcia Rovira, que criou a identidade visual da série através das logos. A revisora Valerie Valentine e Bruno Algarve, desenhista encarregado de mapear o universo de Divagar.

Aos aspirantes a escritor, Paulo José deixa um conselho de quem passou a olhar a escrita com outros olhos. “Muitas vezes, quando achamos que as nossas ideias não são interessantes, acabamos engavetando uma grande história, capaz de dar sentido à experiência de outras pessoas. Então, o que eu gostaria de dizer é que na vida temos ferramentas para fazer as coisas acontecerem e não devemos esperar que alguém nos descubram, é necessário coragem para criar e apresentar essa criação ao mundo”.

A continuação da série ainda vive no mundo das ideias e apesar de não prometer uma data de lançamento para o próximo livro, Paulo José revela já ter começado a escrever os próximos volumes. Enquanto isso, a agenda do autor já inclui compromissos como a participação na Flip (Feira literária Internacional de Parati) no dia 14 de Julho. Acompanhe o universo de "Finita Eternidade" pelo site do autor, clicando aqui.

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