Arquitetura

Marceneiro diplomado, espanhol escolheu MS para transformar madeira em arte

Foi em Campo Grande que "Gabriel Espanholo" viu o quanto brasileiro ainda está aprendendo a valorizar trabalhos em madeira maciça

Danielle Valentim | 08/01/2020 08:48
Oficina fica nos fundo da residência. (Foto: Marcos Maluf)
Oficina fica nos fundo da residência. (Foto: Marcos Maluf)

Graduado em marcenaria artística na Espanha, Gabriel Esposito, de 36 anos, ou Espanholo como ficou conhecido, chegou a Campo Grande há seis anos e sentiu na pele o quanto é difícil se adaptar a uma nova cultura. Logo de cara, pegou ranço do "jeitinho brasileiro" - usado para quase tudo - e só aqui percebeu o quanto a Europa valoriza a arquitetura e decoração em madeira maciça. O olhar do marceneiro realmente é diferenciado e o Lado B foi conferir como ele tem conquistado sua clientela.

Gabriel explica que na Espanha as empresas são auxiliadas pelo governo ao contratarem profissionais graduados e, por isso, só contratam quem tem o certificado. No caso dele, o curso técnico com duração de três anos em uma das melhores escolas do País foi iniciado aos 17 anos.

“Nesta graduação aprendemos toda a base, da história da arte ao desenho artístico. Também vemos matemática e desenhos técnicos e medidas”, conta.

Os tios de Gabriel são marceneiros, o que o inspirou a investir na área. Durante o verão, no fim da adolescência, trabalhou com a família e aos 20 anos iniciou em uma das melhores marcenarias da Espanha, Hijos de Salvador Hidalgo, onde fabricava móveis no estilo Luís XV.

Um dos primeiros trabalhos externos foi realizado na cervejaria da marca Cruz Campo, a queridinha do país e presente no mercado desde 1904. Na Espanha, todas as cervejarias possuem estruturas e são decoradas em madeira maciça.

Gabriel aprendeu das medidas e desenhos. (Foto: Marcos Maluf)

Casado há 10 anos com a campo-grandense Rita Oliveira, Gabriel veio para o Brasil há seis anos, para acompanhá-la. Eles moravam num chalé em Jáen, que aqui em Campo Grande se compara a região do Parque dos Poderes. Sem filhos, as crianças da casa são dois doguinhos.

“Antes de ir morar na Espanha, eu morava na Coopharadio, quando chegamos moramos dois meses com minha mãe e a marcenaria era na Rua Assunção, porém em seguida fomos atrás de uma casa e aqui tem tudo”, destaca Rita, que é jornalista e comanda as redes sociais da empresa.

O marceneiro destaca que na Espanha se trabalha muito com madeira de demolição e os trabalhos em madeira maciça são diferentes devido à cultura e arquitetura diferente.

Por aqui, a primeira dificuldade foi se adaptar à umidade da madeira brasileira. Diferente do estilo espanhol que já vem seca. “Você tem que ter muito cuidado, porque pode impactar no resultado, entortar, por exemplo”, pontua.

Gabriel começou do zero e usava uma bicicleta para fazer orçamentos aqui. (Foto: Marcos Maluf)

É durante o orçamento, que Gabriel alerta o cliente sobre a restauração valer a pena ou não. Por aqui, o espanhol já percebeu que muitos móveis só aparentam ser de madeira maciça.

Gabriel garante que o aprendizado da marcenaria nunca para, já que a base é a mesma, mas as novidades não deixam de surgir.

“Eu não sei 50% de marcenaria. O ofício é tão grande, eu sempre aprendi que a marcenaria é um dia de cada vez. Meu forte é solucionar os problemas das pessoas. Eu faço consertos que ninguém mais sabe fazer. Essa semana eu fiz um ajuste em um guarda roupa. O fabricante havia usado ferragem de baixa qualidade e as gavetas eram muito pesadas. Os trilhos começaram a emperrar e precisei trocar várias materiais”, explica.

O espanhol organizou uma oficina no fundo da residência e a organização é admirável. A criatividade de Espanholo é outro ponto a se levar em consideração, até o suporte para celular ganha um toque especial.

Gabriel mostra como deixa as madeiras secarem. (Foto: Marcos Maluf)
Na oficina é onde todas os trabalhos são produzidos. (Foto: Marcos Maluf)
Oficina foi toda adaptada no fundo da residência. (Foto: Marcos Maluf)
Por dentro, tudo é muito organizado, o que reflete o trabalho de Gabriel. (Foto: Marcos Maluf)

Primeira impressão – Com duas semanas aqui, Gabriel conseguiu um emprego em uma madeireira, um trabalho bem diferente do que fabricar ou restaurar móveis. Logo depois iniciou em uma marcenaria grande da cidade e foi lá que o “jeitinho brasileiro” acabou com a paciência do marceneiro.

“Além do patrão começar a descumprir o contrato de trabalho no terceiro mês e atrasar o salário, quando eu chegava para montar o móvel nas casas, as medidas feitas por outros funcionários estavam todas erradas e eu tinha que refazer o trabalho, além disso a entrega era muito desorganizada, cerca de 3 meses para um simples guarda-roupa, e eu sempre tinha que lidar com a reclamação do cliente como se fosse culpa minha. Decidi iniciar meu negócio”, lembra.

O marceneiro que chegou a pagar R$ 2,500,00 de excesso de mala, devido ao peso das ferramentas trazidas começou a trabalhar sozinho. Sem carro, no início, Gabriel penou para encontrar bons fornecedores e em uma bicicleta saía para fazer orçamentos. Rita ajudou muito neste início. Nem tudo é perfeito, mas Gabriel diz que aos poucos conquista sua clientela.

Os trabalhos não se limitam a móveis. Gabriel fábrica playgrounds de madeira de champanhe, decks para piscina, decorações em geral. O marceneiro admite que não pode competir produção com grandes marcenarias, mas garante a mesma ou até maior qualidade.

As peças à pronta entrega começam com valores de R$ 50. Mas Gabriel produz painéis, bares, adegas, cadeira de pescaria, molduras para quadros, aparadores em patina provençal no branco, cadeiras e etc. O metro quadrado de trabalhos tradicionais com deck custam a partir de R$ 150,00, inclui material, instalação e acabamento em curva. No caso, de decks em curva o preço só é informado durante o orçamento presencial. Balcões simples de cozinha de medida padrão de 1,20 metro, a partir de R$ 650.

Preparação da madeira na oficina. (Foto: Arquivo Pessoal)
Montagem de deck. (Foto: Arquivo Pessoal)

Percepção - Enquanto a Espanha ainda muito se fábrica portas, janelas e estruturas completas com madeira maciça, por aqui a população ainda opta pelo MDF. O valor ao trabalho com madeira é cultural na Europa.

“A casa da minha mãe, por exemplo, é toda trabalhada na madeira de roble que tem a durabilidade maior. Ela escolheu a técnica de pátina provençal no branco e verde. Quanto ao MDF, é uma ilusão de que sai mais barato, mas um móvel e mdf tem vida útil de três anos, enquanto um de madeira maciça pode durar uma vida inteira dependendo da manutenção. Tem que pôr na balança a qualidade. Mas aos poucos as pessoas vão entendendo”, frisa.

A família inteira ficou na Espanha. O irmão caçula é engenheiro industrial e o mais velho é funcionário público. Gabriel volta à Espanha para matar a saudade da família há cada dois anos.

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