Em Pauta

O primeiro travesti da história era um espião francês da corte de Luís XV

Mário Sergio Lorenzetto | 21/09/2014 08:09
O primeiro travesti da história era um espião francês da corte de Luís XV

Após missão, Charles-Geneviéve continuou vivendo como mulher

Charles-Geneviéve. Desde o nome, a dúvida estava instalada. Charles é nome de homem e Geneviéve, de mulher. Um dia, Luís XV, o rei da França, propôs a Charles-Geneviéve uma missão perigosa: entregar algumas correspondências secretas que iriam dissimuladas na sobrecapa de um livro à czarina Elisabeth. Charles-Geneviéve teve a ideia de tomar emprestadas a identidade e as roupas de sua irmã, Lia de Beaumont. Uma missão bem-sucedida na qual usou o primeiro disfarce feminino.

Por mais que ele tenha usado seu uniforme militar, da tropa dos dragões, quando lutava bravamente, ele preferia o pó de arroz à pólvora de canhão. Em outra missão, na Inglaterra, Charles-Geneviéve d´Eon, esse "anfíbio", como dizia Voltaire, não pode deixar de se maquiar, se pentear, se vestir como uma mulher, a tal ponto que toda a Londres logo se apaixonaria por esse dragão, que talvez fosse uma “dragoa”. Não apenas falavam dele, mas também começaram a apostar somas absurdas, nos clubes e cafés, sobre o sexo desse "french chevalier". Os jornais tiraram proveito disso, os apostadores se deleitaram, as caricaturas surgiram de vários pontos. Jornalistas, panfletários e cancionistas encontraram nele uma fabulosa fonte de inspiração.

Diante do escândalo, o rei francês determinou seu retorno com a missão fracassada e os documentos secretos. Continuou a viver como uma mulher. Muito tempo depois faleceria como uma mulher, que só teve seu verdadeiro sexo descoberto quando foram fazer a última toalete do defunto. Charles-Geneviéve é considerado o primeiro travesti importante da história.

Artistas há muito perseguidos

Dos mímicos gregos aos histriões que faziam rir com suas pantomimas e farsas o povo de Roma, os artistas medievais são herdeiros de uma longa linhagem. Uma multidão

de profissionais estava empenhada em divertir nobres e aldeões. As atividades artísticas não estavam separadas, e um malabarista era ao mesmo tempo engolidor de fogo, mímico, prestidigitador, saltador, dançarino, manipulador de marionetes, cantor de músicas amorosas, recitador de poemas épicos e até vendedor de ervas medicinais.

É claro que com tantos talentos eles e elas adquiriram renomes nas praças públicas, bem como conquistaram favores dos senhores e das nobres damas em seus castelos. Eles recebiam um salário em dinheiro e presentes de todo tipo: vestimentas, cavalos e até mesmo objetos de arte. Mas os artistas tinham a reputação de preferir a taverna ao sermão e de ser um parasita e um dissoluto. A aversão da Igreja por eles não esmorecia com facilidade. Suas apresentações chegaram a ser proibidas a todo o clero. No Concílio de Paris de 1212, retomaram as proibições, vetando aos eclesiásticos manter bufões para sua diversão.

Cultura livre e popular é sempre a primeira vítima

No entanto, as censuras das atividades religiosas permaneceram vãs e os artistas penetraram por todas as partes, até mesmo nos palácios episcopais. Não conseguindo fazê-los calar, a Igreja favoreceu alguns, em particular aqueles que se juntavam às multidões de peregrinos para recitar histórias piedosas ou a vida dos santos.

Como se vê, as dificuldades de relacionamento dos artistas com os poderosos vêm de longa data. Essas atividades são as que sofrem as primeiras baixas quando surgem problemas administrativos ou financeiros. E ainda cabe a pergunta: em uma sociedade que se julga contemporânea, é possível conviver exclusivamente com as artes que cantam ou recitam histórias piedosas? Campo Grande se converterá na capital da música sacra que aboliu o jazz, blues, rock, samba, sertanejo e música erudita. Essa dupla, Bernal e Olarte, passará para a história. História de manipulação e engodo.

Europeus não se preocupavam com pobreza

Até o início dos anos 1800, era comum a ideia de que cada um ocupava o lugar que Deus lhe havia reservado - pobres eram pobres por vontade divina. Somente com as denominadas revoluções de 1848 que a forma de perceber a pobreza foi submetida a uma grande ruptura. Foi a partir de então que os empregados das sociedades modernas e industrializadas exigiram o direito ao trabalho e, diante de sua falta, o direito à sobrevivência material. A proteção social deixava de ser um favor pessoal de acordo com a vontade dos ricos e passava a ser um direito gerido pelos governantes. Isso na Europa.

Cuidar do pobre para produzir mais

No Brasil, o pobre era o "mulato vagabundo inútil". A criação de um ideário, de uma livre associação entre mestiçagem e vagabundagem, era um discurso preconceituoso e retórico que, ainda em menor grau, subsiste e revela a visão que as elites guardavam da população. Em nossa região, o discurso não era contra o "mulato" e sim contra o "bugre". Pobre era sinônimo de bugre.

Com o tempo começaram a se dar conta de que era necessário, até para o bom andamento da produção capitalista, cuidar de sua população em situação de vulnerabilidade. Uma das primeiras ações foi limitar o tempo de horas trabalhadas e o trabalho infantil, o que gerou impacto positivo nos salários.

Poder do voto pode garantir combate à pobreza

Existem quatro teses que concorrem entre si, ou são complementares, para explicar os motivos dos governantes interferirem na questão da pobreza: a primeira diz que a industrialização dissolveu os laços familiares e comunitários e forçou os governantes a interferir. Outra vertente defende que o capitalismo tornou necessários regras e programas para conter os arroubos do capital sobre os trabalhadores. Uma terceira faz valer a ideia de que os trabalhadores são capazes de pressionar para aumentar seus benefícios; e a última diz que os direitos sociais são a etapa terceira de um caminho que começa com os direitos civis, prossegue com os direitos políticos e acabam levando

aos sociais. O poder do voto conduziria a políticas que beneficiam camadas menos favorecidas.

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