Em Pauta

Como o Iraque foi inventado por Churchill

Mário Sérgio Lorenzetto | 20/02/2020 06:37
Como o Iraque foi inventado por Churchill

Imagine que os mandatários dos Estados Unidos e da China reúnam-se e tracem uma linha no mapa criando um novo país. Ele seria constituído pelas terras do Mato Grosso do Sul, parte da Bolívia e parte do Paraguai. Repentinamente, esse país artificial reuniria povos tão diferentes sob a mesma Constituição, moeda e língua. Tem tudo para dar errado! Foi o que fizeram na região que hoje chamamos de Iraque.

O diálogo que selou a (má) sorte da Mesopotâmia.

Logo após a paz ter sido selada, no fim da Primeira Guerra Mundial, os dois mais importantes mandatários do mundo estavam reunidos em um escritório londrino. Georges Clemenceau, primeiro-ministro francês e seu colega britânico, Sir David Lloyd George, travaram um diálogo que mudaria o mundo - para pior.
- Bem, o que vamos discutir? perguntou o francês de grandes bigodes.
- A Mesopotâmia - respondeu o britânico de longas suíças.
- Ah, você pode ficar com ela - disse o francês.
O território que eles dividiram há 90 anos, não sai dos noticiários, sempre com notícias fúnebres. A constante turbulência daquela região teve início nessa "amistosa" conversa.

Dos sultões para os guerrilheiros tribais árabes.

Antes da Primeira Guerra Mundial, o Oriente Médio era governado pelos sultões do Império Turco-Otomano fundado em 1453 por Maomé, O Conquistador. Um riquíssimo império de 464 anos. O principal berço da civilização, chamado pelo europeus de Mesopotâmia, ficava entre os rios Tigre e Eufrates. Estava dividido especialmente por definições religiosas entre árabes xiitas, sunitas e curdos. Não havia maiores desavenças entre eles e tinham um sonho comum: expulsar os turcos da região.
No transcurso da Primeira Guerra Mundial, os ingleses procuraram os chefes guerrilheiros árabes para combater os turcos otomanos. Prometeram que em caso de vitória, criariam reinos independentes para cada um dos povos, em troca da ajuda contra o inimigo comum. E a barganha funcionou. Enquanto os guerrilheiros acossavam as tropas turcas nas areias do deserto, o exército britânico avançou sobre as principais cidades da região. Em março de 1917, os britânicos tomaram Bagdá. Apunhalado em seu âmago, o Império Otomano viu ruir outro bastião simbólico: os ingleses se tornaram o trigésimo quarto exército a marchar triunfalmente nos paralelepípedos de Jerusalém. Para os ocidentais, era uma nova cruzada. Mas tão demagógica que colocava árabes ao lado de ingleses e franceses. Não colou! E a lua-de-mel durou pouco.

 

A Grande Traição.

Para os ingleses, foi um grande negócio. Em pouco tempo se tornaram os "donos" do Oriente Médio. Para os árabes, foi a Grande Traição. Voltaram a se rebelar, dessa vez contra os ingleses. A reação foi brutal. Os ingleses usaram o terror aéreo. Despejaram mais de 97 toneladas de bombas em crianças, mulheres e idosos. Aldeias inteiras desapareceram do mapa. Também usaram a mesma tática que os norte americanos tinham empregado para derrotar os indígenas: matar de fome. Os aviões foram comandados para matar todos os rebanhos árabes. Essa curta guerra matou 9 pilotos ingleses. Do outro lado, mais de 9 mil árabes perderam a vida.

Churchill cria o Iraque.

Ao baixar a poeira da rebelião, Winston Churchill, aquele que seria o primeiro-ministro mais famoso da história da Inglaterra, na época administrador das colônias britânicas, reuniu um grupo de diplomatas e geógrafos europeus na Conferência do Cairo, em 1921. A tarefa era traçar, com régua e lápis, as fronteiras dos novos domínios ingleses. Nesse encontro, Churchill inventou dois países. Um deles foi o reino da Jordânia. O outro foi o Iraque, um estado artificial que teria 60% de habitantes xiitas, 20% de sunitas e 20% de curdos. Foi a maior besteira que Churchill cometeu em sua longa e vitoriosa vida. Nunca mais quiseram consertar a aberração. O petróleo dita a regra da guerra: vale tudo.

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