Cidades

Pesquisadores criam capacete que previne bebês de paralisia cerebral

João Humberto | 20/10/2014 09:00
Professores Marco Naka e Durval Palhares comandam pesquisa do capacete térmico (Fotos: João Garrigó)
Professores Marco Naka e Durval Palhares comandam pesquisa do capacete térmico (Fotos: João Garrigó)

Casos de paralisia cerebral em recém-nascidos poderão diminuir após a comercialização do capacete térmico (cool cap) que está sendo desenvolvido por pesquisadores do mestrado em Biotecnologia da UCDB (Universidade Católica Dom Bosco). A tecnologia é portátil, pode ser colocada tranquilamente numa ambulância e deve ser utilizada nos bebês com baixa oxigenação no cérebro até seis horas após o parto, colaborando para a redução da atividade cerebral e diminuindo as sequelas no caso de falta de oxigenação.

A pesquisa é coordenada pelo professor Marco Hiroshi Naka, doutor em Biomecânica pela Universidade de Kyoto, e tem orientação clínica do médico e pós-doutor Durval Palhares, professor titular de Pediatria da UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul). Ela vem sendo desenvolvida há quatro anos por alunos do mestrado em Biotecnologia e dos cursos de Engenharia Mecânica, Engenharia Mecatrônica e Engenharia da Computação da UCDB.

Durval relata que nos países de primeiro mundo, como os Estados Unidos, os capacetes térmicos são bastante grandes e não cabem em ambulâncias. Ele apresentou a ideia ao professor Naka e sugeriu uma tecnologia mais compacta, para facilitar o manuseio nos centros cirúrgicos, UTI neonatal e o transporte, além de um preço muito mais baixo que o convencional, vendido na faixa de US$ 85 mil dólares.

Naka conta que no primeiro ano de pesquisa propôs aos pesquisadores envolvidos um estudo aprimorado referente à termodinâmica para depois aplicar uma técnica inovadora. “Foi feita toda uma modelagem teórica e depois disso é que começamos realmente pensar num projeto físico. Como não existem muitos autores que abordam a termodinâmica craniana, a primeira parte foi bastante difícil, tivemos que nos esforçar muito. Agora o capacete já está praticamente pronto e estamos finalizando a escrita do projeto para submetê-lo ao depósito de patente”.

Para garantir ao capacete um resfriamento de 12 a 14 graus e fácil portabilidade, os pesquisadores se propuseram a trabalhar com o efeito Peltier, que ocorre em determinados materiais específicos. Marco Naka ressalta que as placas de Peltier cabem em notebooks e quando se aplica uma corrente sobre elas acaba sendo gerado resfriamento de um lado e aquecimento do outro.

Alunos manuseiam a tecnologia que é mais compacta que a desenvolvida nos Estados Unidos

Diferentemente do capacete desenvolvido por pesquisadores da UCDB, os capacetes convencionais usados nos Estados Unidos possuem um sistema de resfriamento líquido e precisam de bombeamento. Além disso, necessitam de um reservatório de água e uma mangueira acoplada ao capacete e que acaba envolvendo a cabeça do bebê. “O sistema de bombeamento garante o resfriamento da água”, detalha Naka.

Consumo metabólico – De acordo com Durval, o objetivo principal do capacete é diminuir o consumo metabólico do bebê. Ele explica que quando um recém-nascido apresenta falta de oxigenação no cérebro, certamente pode desenvolver sequelas como a paralisia cerebral. “Esse estado, logo ao nascimento, pode ser prognosticado por meio da Escala de Apgar, teste que revela o nível de asfixia. Abaixo de seis, por exemplo, já ocorrem alterações na vasculatura do sistema nervoso central. O bebê então pode apresentar contração dos vasos sanguíneos inicialmente e posteriormente a dilatação desses vasos, consumindo toda energia do cérebro e dando início às lesões permanentes”.

No entanto, antes que isso aconteça, há um período de intervenção que pode diminuir o metabolismo do bebê. “Esse capacete vai garantir justamente isso, mas só tem que ser colocado nesse recém-nascido num período bem precoce, antes das seis horas após seu nascimento. Às vezes a criança nasce com batimentos cardíacos abaixo de 100 e por isso apresenta baixa oxigenação por conta do consumo do estoque de energia do cérebro. Dependendo do tempo que ela estiver com asfixia, o prognóstico será pior, mas se houver intervenção com o capacete térmico, a situação pode ser outra”, frisa Durval.

Para diminuir o metabolismo através da hipotermia (quando a temperatura corporal do organismo cai abaixo do normal), é necessário um consumo baixo de energia. Só que para diminuir esse consumo e consequentemente as sequelas na prevenção da encefalopatia hipóxico-isquêmica (síndrome neurológica usualmente relacionada à asfixia perinatal, responsável por desencadear diversas alterações que culminam na lesão do sistema nervoso central), o capacete deve ser usado em até seis horas, depois disso não adianta mais.

Capacete térmico desenvolvido por pesquisadores da UCDB também será mais barato que o convencional
Orientador clínico da pesquisa conta que o capacete deve ser colocado no bebê até 6 horas após nascimento.

O médico cita que o capacete deve ser usado em média, até três dias pela criança, tempo suficiente da fase crítica em que pode apresentar alteração vascular e de fluxo sanguíneo cerebral. “Os capacetes podem ser disponibilizados em hospitais, ambulâncias e em lugares estratégicos para garantir a hipotermia. Com certeza é uma pesquisa muito benéfica”, conclui Durval, relatando que agora o capacete precisa ser aprovado por um comitê de ética da UCDB ou da UFMS, que deve emitir parecer informando que a tecnologia não é agressiva aos bebês com melhor prognóstico e na prevenção da encefalopatia hipóxico-isquêmica.

O projeto conta com apoio financeiro da UCDB desde o início e também já recebeu recursos da Fundect (Fundação de Apoio ao Desenvolvimento do Ensino, Ciência e Tecnologia do Estado de Mato Grosso do Sul). Quinze alunos entre graduandos e mestrandos já trabalharam nele, inclusive recebendo bolsas.

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