Cidades

MS tem 35% dos juízes em férias

Redação | 25/01/2008 22:59

Dos 168 juízes que a justiça estadual de Mato Grosso do Sul tem, mais de um terço estão de férias neste mês de janeiro. São 59 magistrados nessa condição, o que totaliza 35% do total. Dos 25 desembargadores do TJ (Tribunal de Justiça), cinco, ou 20%, também não está trabalhando neste mês.

O resultado são julgamentos parados na segunda instância, à espera da volta de um desembargador que já iniciou a votação. Na primeira instância, os magistrados que estão em atuação ficaram com ainda mais processos acumulados, porque além de cuidar da vara pela qual são responsáveis, estão substituindo um colega em férias.

Para os advogados, segundo a análise de profissionais ouvidos pelo Campo Grande News sobra mais trabalho, uma vez que os prazos continuam correndo, dificuldade para tirar folga, e problemas para fazer as ações andarem a contento, com tantos juizes atuando como substitutos, sem conhecer as peças processuais a fundo.

O recesso informal para parte dos magistrados estaduais foi a forma encontrada pelo Tribunal de Justiça para atenuar o reflexo negativo de uma mudança ocorrida em 2005, o fim das férias forenses, determinada pela emenda 45, responsável por uma pequena reforma no Poder Judiciário. A medida legal acabou com as duas férias anuais, de julho e janeiro, que faziam o judiciário parar de vez. Mas como os juízes continuam com direito a duas férias por ano, direito previsto na Loman (Lei Orgânica da Magistratura Nacional), os efeitos práticos acabaram não sendo tão positivos assim, porque antes havia férias coletivas e agora cada juiz pode tirá-las, duas vezes ao ano, quando bem entender, e os prazos dos processos continuam correndo.

A presidência do TJ em MS e a entidade que representa os advogados, a OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) tem opinião semelhante: o que era uma intenção de moralizar e melhorar a imagem do judiciário, acabou tendo efeito prático diferente. O presidente da OAB no estado, Fábio Trad, fez, na conversa com a reportagem o que chamou de mea culpa, considerando que a entidade foi umas grandes defensoras do fim das férias forenses. "Pensamos que seria mais produtivo e acabou se tornando um obstáculo quase intransponível para o andamento dos processos".

O desembargador João Carlos Brandes Garcia, presidente do TJ, expressa entendimento parecido. "A mudança não correspondeu às expectativas", define. "Para o andamento dos processos ficou até pior que antes".

Ação parada - Um caso que ilustra a afirmação do advogado e do magistrado é uma ação referente ao processo que envolve uma figura bastante conhecida, o ex-governador José Orcírio Miranda dos Santos, o Zeca do PT. Um recurso contra uma decisão que trancou uma ação pena que corre contra ele, em trâmite desde o ano passado, só deve ter o julgamento retomado em março. Isso porque em janeiro, dois dos cinco desembargadores da Seção Criminal, onde o caso corre, estão em férias e como eles já iniciam o julgamento não podem ser nomeados substitutos. Em fevereiro, quando esses magistrados retornam ao trabalho, será vez do relator do processo entrar em férias. Sem ele, o andamento do caso é impossível.

Assim como esse, há centenas de outros, envolvendo gente menos famosa, relata o conselheiro federal da OAB Wladimir Rossi, advogado tributarista que já presidiu a Ordem no estado. Segundo ele, depois que as regras para recesso no judiciário mudaram, já chegou a haver casos de processos que ficam um ano parados porque a turma responsável pelo julgamento sempre tem alguém de férias.

Férias mais ou menos coletivas - O presidente do TJ disse ao Campo Grande News que o fato de tantos juizes não estarem trabalhando neste mês de janeiro foi uma forma encontrada de tentar minimizar o prejuízo que provoca distribuir as férias ao longo do ano todo. Segundo ele, houve uma intenção do próprio tribunal de fazer coincidir o período de folga da maioria com a época do ano em que o País, historicamente, tem movimentação menor dadas as férias das escolas, festas de fim ano e até a proximidade do carnaval.

Para os advogados, porém, a solução não adianta. Rossi aponta que eles, ao contrário, tiveram as férias dificultadas porque os prazos continuam correndo.

Tanto o presidente da OAB estadual quanto o conselheiro federal defendem que o assunto seja revisto. "Defendo até a volta das férias forenses", afirma Fábio Trad. O presidente do TJ acredita que o caminho ideal seria que todos sentassem e discutissem uma forma de aperfeiçoar o sistema. Para ele, do jeito que está, fica claro que o andamento dos processos foi prejudicado, apesar da boa imagem provocada pelo fato de o judiciário "funcionar ininterruptamente", como diz a emenda 45.

Brandes Garcia acredita uma solução poderia ser a retomada das férias forenses, com a correção de problemas que ela significava, como a ampliação do funcionamento do judiciário durante o período de recesso coletivo em relação ao que ocorria antes.

A OAB nacional já tem proposta sobre o assunto, como informou Wladimir Rossi. A idéia seria coincidir as férias dos juizes e desembargadores com o período de recesso.

No Congresso Nacional, tramita um processo um pouco mais radical. Proposta de Lei Complementar do senador Eduardo Suplicy reduz de 60 para 30 dias anuais as férias dos juizes. A matéria, proposta em 2007, aguarda a análise da CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) do Senado, a quem cabe dizer se um projeto é ou não legal, para que ele possa ter andamento na Casa.

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