Capital

No enterro de vítima da covid, neta descobre que restos mortais de avô "sumiram"

Família só soube que parente não estava mais sepultado em jazigo pago quando a viúva foi ser sepultada ao lado dele

Izabela Sanchez | 12/08/2020 12:58
Jazigo onde Gertrudes seria enterrada, com placas de desconhecidas, no Cemitério Memorial Park em Campo Grande (Foto: Divulgação)
Jazigo onde Gertrudes seria enterrada, com placas de desconhecidas, no Cemitério Memorial Park em Campo Grande (Foto: Divulgação)

A família de Gertrudes Santana, que faleceu na sexta-feira (7) aos 82, vítima da covid-19 em Campo Grande, diz que vai processar o Cemitério Memorial Park. Eles acusam a empresa de ter exumado o corpo de Nelson Marciano Santana, enterrado em 2011, sem autorização, e ter sepultado os restos mortais de duas mulheres que elas não conhecem no jazigo.

Quem relata a história é a técnica em enfermagem Kelly de Oliveira dos Santos, 33, neta de Gertrudes. Ela conta que a mãe, Maria de Fátima da Silva Santana, de 53 anos, já acionou advogada.

Kelly conta que a família tem convênio com a empresa funerária há quase 40 anos, contrato que era de Nelson e que passou às filhas depois que ele faleceu. A neta cita que a mãe dela precisou regularizar os pagamentos após período de inadimplência quando o convênio estava em nome da irmã de Maria de Fátima.

A técnica em enfermagem diz que a funerária também não tem registro dos procedimentos de exumação do corpo de Nelson e dizem não saber onde estão os restos mortais do avô. 

Kelly contou que a avó sentiu-se mal na quinta-feira (6), foi levada a um posto de saúde no Bairro Coophavilla e em seguida, transferida ao Hospital Regional Rosa Pedrossian, referência no atendimento a pacientes com a covid-19, onde faleceu na sexta-feira (7).

“Meu avô era titular, pagou anos e anos. E aí como ela [tia] atrasou o pagamento, minha mãe acertou. Mesmo se for pra exumar eles têm que avisar, até o momento não tinha nada. Não tinham comunicado que tinham exumado”, diz Kelly, completando que a família “não autorizou nada”. 

“A gente já não pode fazer o velório da minha vó e quando não acharam o corpo do meu avô, foram dois enterros pra gente. Não entraram em contato [cemitério], falaram que iam entrar em contato na segunda. A gente já foi atrás da advogada, vamos entrar com processo. Do mesmo jeito que aconteceu com a gente pode acontecer com outras famílias”, relata.

Kelly mostrou para a reportagem uma ata do cemitério sobre o ato do enterro de Gertrudes. O documento cita que a família queria enterrá-la ao lado de Nelson, sepultado em jazigo “de duas gavetas no sistema galeria”. “Ao abrir foi verificado pelos sepultadores que tanto na gaveta 1, quanto na gaveta 2 estavam sepultadas outras pessoas do sexo feminino, sendo assim, não foi realizado o procedimento de exumação”.

O documento oficial informa que o enterro da idosa ocorreu às 11h39 de sábado (8).

Nem os sepultadores sabiam que tinha acontecido, conforme ata do dia do enterro (Foto: Divulgação)

Acusação – Advogada constituída pela família, Etila Guedes, explica que Maria de Fátima tem toda a documentação que comprova a acusação. Ela cita que no dia 3 de maio de 2018, sem saber que havia inadimplência por parte da irmã, Maria de Fátima recebeu comunicado do Memorial Park informando que o corpo de Nelson seria exumado por falta de pagamento.

Etila explica, ainda assim, que já no dia 14 de maio de 2018, conforme documentação, a cliente foi até a administração, quitou a dívida de cerca de R$ 2,4 mil e foi comunicada na mesma hora de que o procedimento seria cancelado e, conforme pediu ao cemitério, o corpo de Nelson continuaria no mesmo jazigo.

O contrato da família é com a Pax Real e o transtorno, segundo Etila, é maior porque Nelson foi um dos primeiros funcionários da empresa. A advogada diz que nem a funerária foi comunicada da exumação.

“Ela ficou tranquila, continuou pagando em dia, tem todos os comprovantes. Na sexta estava ok, para a Pax estava tudo certo. Ela até pagou os R$ 800 da exumação do corpo do pai porque para ela o pai nunca havia saído de lá. Mas não foi isso que aconteceu”.

“Temos documento de que no dia 14 de maio de 2018 ela fez a quitação e resolveu o problema. Está documentado que o corpo continuaria lá e não haveria exumação”, afirma a advogada. 

Outro lado -  Procurado, o cemitério enviou nota. A administração cita que o corpo foi exumado com autorização da titular “à época” e realizado “devido a uma questão contratual”.

A empresa diz que no sábado (8), por se tratar de dia não comercial e estar voltada ao aumento de demanda e exclusivamente aos sepultamentos, além da “imprevisibilidade da atual situação de pandemia”, não houve tempo de “fazer a remoção dos restos mortais do local de exumação para o jazigo onde foi sepultado a idosa”. 

“Assim que for possível, dentro de um cronograma adaptado para esse novo momento de altíssima demanda devido à covid-19, em que se dará a preferência aos sepultamentos, nossa equipe fará a remoção”, afirma a nota da empresa, que é assinada pela assessoria de imprensa. 

A reportagem também procurou a Pax Real, mas não foi possível obter posicionamento até a conclusão da reportagem.

Nos siga no