Capital

Justiça interdita centro terapêutico denunciado por explorar dependentes

“É inconcebível permitir que a situação precária dos internados se estenda por mais tempo”, afirma desembargador

Aline dos Santos e Ana Oshiro | 05/02/2021 09:17
O Tribunal de Justiça ordenou a interdição do Centro Terapêutico Resgatando e Conquistando Vidas. (Foto: Arquivo)
O Tribunal de Justiça ordenou a interdição do Centro Terapêutico Resgatando e Conquistando Vidas. (Foto: Arquivo)

A Justiça ordenou  a interdição do Centro Terapêutico Resgatando e Conquistando Vidas, localizado no Jardim Veraneio. O local foi denunciado por não ter estrutura adequada e por coagir os internos a trabalharem para dar dinheiro à clínica.

De acordo com o TJMS (Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul), a comunidade terapêutica fica impedida de receber novos pacientes para tratamento e a prefeitura de Campo Grande deve fazer a remoção das pessoas acolhidas para instituições de saúde com recursos adequados às necessidades especiais e peculiares de cada um dos internos.   A depender do caso, deve ser promovido o retorno do dependente para o convívio familiar.

“É inconcebível permitir que a situação precária dos internados se estenda por mais tempo, como dito alhures ela vem se arrastando por mais de 4 anos, com a omissão da prefeitura municipal que ao invés de interditar o estabelecimento concede prazos intermináveis ao responsável para a adequação das irregularidades, que ao meu ver nunca ocorrerá”, afirma o desembargador Marcelo Câmara Rasslan.

Ele é o relator do processo e teve o voto acompanhado, por unanimidade, pelos magistrados da 1ª Câmara Cível. O julgamento aconteceu na última terça-feira (dia 2).

Segundo a decisão, diversas inspeções desde 2016 revelaram que o Centro Terapêutico Resgatando e Conquistando Vidas não tem licença sanitária e opera de forma irregular, desobedecendo normas de saúde e segurança.

“Não bastasse a constatação de tais irregularidades, também há nos autos indícios de que houve violência à integridade física e psíquica dos residentes”, afirma Rasslan.  A multa diária em caso de descumprimento é de R$ 10 mil.

Mão de obra explorada – Em abril de 2019, o MPMS (Ministério Público de Mato Grosso do Sul) recebeu denúncia de que os internos são coagidos a trabalhar. Seria obrigatório repasse de 30% do valor ganho com o trabalho para o presidente da comunidade, no caso o pastor Joelson Xavier Gomes.

Segundo o denunciante, a comunidade acolhe 80 pessoas. Do total, 60 saíam para trabalhar. A pessoa relata que um interno perdeu a perna em acidente de trabalho e que a maioria dos pacientes não tem documentos.

“Expôs, ainda, que durante três semanas, os acolhidos repassam o salário total da semana para a aquisição de um veículo para a comunidade”.

Fotografia do centro terapêutico em Campo Grande anexada ao processo pela defesa. (Foto: Reprodução)

Defesa – No processo, a defesa do centro terapêutico informa que tem feito melhorias de acordo com as possibilidades financeiras e reduziu o número de atendidos de 60 para 35. O documento detalha que são sete alojamentos com banheiros, cozinha, refeitório, campo de futebol, quadra de areia, sala de TV, academia artesanal, dois banheiros sociais e dois veículos para assistência.

De acordo com a PGM (Procuradoria-Geral do Município), não se pode atribuir ao poder público a responsabilidade pela remoção de 56  internos, que se encaminharam o  Centro Terapêutico Resgatando e Conquistando Vidas, de livre e espontânea vontade. Nesta sexta-feira (dia 5), a reportagem questionou a prefeitura sobre a remoção, mas não obteve retorno até a publicação da matéria.

O Campo Grande News foi até ao local, mas não obteve autorização para entrar. Tinha colchões na cerca e som de louvor.

“É uma pena” – O pastor Joelson Xavier Gomes afirma que é feito trabalho de acolhimento de pacientes encaminhados por familiares e prefeitura. “O Ministério Público não tem onde colocar essas pessoas. É uma pena”. Atualmente, são 30 pacientes atendidos.

Líder do Ministério Evangélico Conquista, localizado no Jardim Noroeste,  o pastor afirma que ninguém é obrigado a trabalhar, mas há essa possibilidade de reinserção social por meio de parceria com empresa de construção civil.

“A empresa repassa para a gente, fazemos o pagamento e retiramos um percentual. Mas é somente para a manutenção da instituição. O Ministério Público entra com essa ação com base em denúncia anônima. Mas não conhece o trabalho a fundo”, afirma.

O Campo Grande News foi até ao local, mas não obteve autorização para entrar. (Foto: Ana Oshiro)


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