Capital

Deficiente mantida trancada no Nova Lima ainda não tem atendimento

Vanda Escalante | 27/06/2011 14:33

Caso foi denunciado por vizinhos na semana passada, mas autoridades ainda não conseguiram vaga para internação da mulher.

Uma sequência de atitudes negligentes, ignorância e falta de acesso aos serviços especializados de saúde. A situação da mulher de 38 anos, com grave deficiência mental, mantida encarcerada pela família no bairro Nova Lima, em Campo Grande, é o resultado desse quadro, que mistura elementos sociais e culturais ao despreparo do aparato público para atendimento a pessoas com necessidades especiais.

A história da mulher no Nova Lima ainda não tem um desfecho, mas a expectativa das autoridades que conduzem o caso é de que seja possível, “de preferência ainda hoje” conseguir uma vaga para internação hospitalar.

O caso veio a público no final da semana passada, em pleno feriado de Corpus Christi, o que, segundo as autoridades, atrasou o andamento das providências. Tanto a Polícia Civil quanto o Consep (Conselho Estadual da Pessoa Portadora de Deficiência), e outras instâncias de atendimento já acionadas, estão em busca de uma vaga para internação, já que a avaliação de todos que atenderam a ocorrência é de que o estado geral da mulher requer tratamento médico de urgência.

A denúncia foi feita por vizinhos da família. Polícia e membros do Consep estiveram na casa da família e constataram as más condições em que os pais mantém a filha. Trancada em um quarto sem iluminação, cercada por fezes e urina, ela não recebe acompanhamento psiquiátrico desde os sete anos de idade, segundo relatou a própria mãe no dia da ocorrência.

Ela contou também que, nesse tempo todo, a filha passou por um consulta com um clínico geral e foi atendida por um ginecologista, que prescreveu medicamento para suspender a menstruação. Sobre o atendimento psiquiátrico, a mãe contou que a filha tomava remédios quando criança, mas ao terminar o efeito da medicação, se tornava muito agressiva, o que fez a mãe suspender, sem acompanhamento médico, o uso da medicação.

No dia da ocorrência, a agressividade da mulher era visível. “Ela batia na porta com muita força”, relatou o presidente do Consep, Luiz Santos. “Mas é preciso avaliar também que o estado geral dela não se deve apenas à doença mental, mas também às condições em que está sendo mantida durante todo esse tempo, porque a falta de tratamento adequado acaba gerando outras patologias”, avalia.

Junto com a busca por atendimento imediato, a polícia está também conduzindo um inquérito para apurar as responsabilidades pela situação de maus tratos. Além da família, a situação seria conhecida também por agentes de saúde que já teriam visitado a residência.

“Não se trata de punir a mãe, mas sim de conseguir aparato legal para tirá-la daquela situação, já que um mandado judicial á capaz de obrigar a internação”, comenta o presidente do Consep.

Pai - Na manhã desta segunda-feira (27), a reportagem do Campo Grande News foi até o endereço da família, no Bairro Nova Lima. O pai foi quem nos recebeu e, demonstrando grande hostilidade, recusou-se a falar sobre a filha. “Não quero ninguém enchendo o saco aqui e o delegado disse que não era para a gente receber mais ninguém”.

Mesmo negando uma entrevista, o homem disse que já está “tudo encaminhado” e que a filha receberá atendimento “numa escola, pra ver se ela aprende alguma coisa”. Ele afirmou que é contra a internação, porque acredita que a medida não vá resolver o problema da filha. “Ela é assim, não tem o que fazer. Se internar, vão deixar ela amarrada e dopada, vai ser pior”, afirma o pai.

O homem contou também que acredita que manter a filha trancada é a maneira de proteger a ela mesma e ao restante da família. “Não tem como deixar por aí uma pessoa que entra na cozinha, joga tudo no chão, quebra copo, quebra tudo e ainda fica pisando em cima”, diz ele.

Saúde - Para os responsáveis pelo inquérito no 2º DP, esse caso é menos de polícia do que de saúde pública. O delegado afirma que a polícia está cumprindo seu papel, mas acredita que a solução está mesmo é no atendimento de saúde especializado.

“Acredito que houve uma seqüência de negligências”, comenta o presidente do Consep, Luiz dos Santos, informando ainda que o Conselho tem recebido algumas denúncias de falta de atendimento adequando a pessoas com deficiência, mas afirma que casos como o do Nova Lima raramente chegam ao conhecimento do Consep.

“O preocupante é que se as coisas chegam a esse ponto aqui em Campo Grande, deve haver outras situações até piores pelas cidades do interior”, diz. Para ele, em situações como essa não resolve culpar apenas a família. “Tem que haver condições de acesso aos atendimentos”, afirma.

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