Capital

Após parir, mães ficam com bebês em cadeira no corredor de hospital em MS

"Eles ficam em sofrimento, no desconforto, em vulnerabilidade e expostos a riscos sérios", diz denúncia

Por Cassia Modena | 09/04/2024 09:47

O momento após o parto pede tranquilidade e algum descanso, além de medidas que protejam mães e bebês de possíveis riscos. Mas isso não está sendo garantido às mães e recém-nascidos no Humap (Hospital Universitário Maria Aparecida Pedrossian), o HU de Campo Campo Grande.

Na noite desta segunda-feira (8), vídeos enviados por servidor da instituição pública mostram recém-paridas sentadas em cadeiras de plástico com bebês nascidos há poucas horas no colo (assista acima). 

Por causa da superlotação, o jeito é se acomodar ali ou em macas improvisadas no corredor da maternidade e do centro obstétrico, onde são feitos os partos. "Eles ficam em sofrimento, no desconforto, em vulnerabilidade e expostos a riscos sérios", diz o denunciante sobre os pacientes. 

O perigo de pegar uma infecção é maior no corredor, onde "todo tipo de pessoa circula", destaca o servidor, que preferiu não ser identificado.

Fora isso, devido ao pouco espaço e estarem se recuperando dos partos, seja o natural ou o cirúrgico, as mulheres podem até derrubar os filhos, sem querer. "Se um bebê cai, pode ter um traumatismo craniano e morrer", alerta também.

Em 2022, corredor da maternidade como deveria estar sempre: sem macas e cadeiras (Foto: Arquivo/Humap)
Em 2022, corredor da maternidade como deveria estar sempre: sem macas e cadeiras (Foto: Arquivo/Humap)

Não fosse o bastante, as mães ainda precisam lidar com constrangimentos. 

"Enquanto estão amamentando em cadeiras desconfortáveis, elas sangram, sujam a roupa e não têm onde se trocar e tomar um banho de imediato. Já vimos mulheres todas ensaguentadas, morrendo de vergonha, que ainda estão sem acompanhantes", relata ainda o servidor.

Esperando há 1 dia - Jovem de 21 anos, que também optou em não se identificar, relatou à reportagem a demora para passar por cirurgia cesariana. Ela está no hospital desde as 8h de ontem (8), completando 24 horas de espera nesta manhã.

A gestante aguarda numa cadeira de fio. "Já me deram muitas desculpas. Que não tinha leito e não tinha como me operar e deixar na cadeira de fio no corredor. Que o centro obstétrico estava sobrecarregado por conta de cirurgias de emergência", cita.

A mulher tem problema de saúde que poderia gerar complicação num parto normal, por isso, o mais indicado no caso é o parto cirúrgico. 

Ela ficou em jejum desde o almoço de domingo (7) até dar entrada na instituição. Se alimentou, mas pouco, desde que a cirurgia foi adiada. "Como eles não fizeram o parto ontem, me deram um pão e um copo de chá às 21h de ontem para reiniciar o jejum total à 00h", conta. A previsão é a cesariana ocorrer hoje, às 13h.

Faltam profissionais - O caos acaba agravado pela falta de profissionais para atender tanta gente. "Todos se desdobram, mas teve um dia que um bebê precisava de atendimento de urgência e não tinha médico plantonista para atender e nem leito neonatal. O que tinha era um obstetra que estava fazendo uma cirurgia", continua contando o servidor.

No vídeo, é possível ver profissionais de saúde se espremendo nos corredores, ao lado de equipamentos, para atender mulheres e bebês. Isso porque precisam atender quem está dentro dos quartos, em leitos e macas.

Toda essa situação é "rotina há muito tempo" no Humap, finaliza o denunciante. "Estamos cansados de ver isso. Só vai chegando gente, chegando gente, e o hospital não dá conta de atender", desabafa.

Vagas - No início deste ano, a instituição deixou de receber pacientes "vaga zero" no setor de Pronto Atendimento Médico, ou seja, aqueles encaminhados pela central de regulação da Sesau (Secretaria Municipal de Saúde), independentemente de a unidade hospitalar ter condições de atendê-los.

Ainda assim, os setores que recebem mães e bebês seguem aceitando esse encaminhamento e lidando com o excesso de demanda. 

Em nota, a assessoria de imprensa da instituição admitiu que está enfrentando situação de superlotação na maternidade, centro obstétrico e sala de pré-parto desde a quinta-feira da semana passada (4).

Ontem, havia cinco recém-nascidos internados, sendo três necessitando de cuidados intensivos e dois necessitando de cuidados intermediários. Em mulheres, havia 18 em pré-parto, sendo oito pacientes em leitos extras. 

Outras 36 pacientes estavam acomodadas na enfermaria da maternidade em alojamento conjunto, para tratamento clínico e cirúrgico, obstétrico e ginecológico. Dessas, seis foram colocadas em leitos extras. As informações foram fornecidas pelo próprio hospital. 

O MPMS (Ministério Público Estadual) e a Sesau foram acionados com urgência, para cessarem autorização para encaminhar mais gente. 

"A direção do Humap enviou ofício ontem no final da tarde à Central de Regulação, à Secretaria Municipal de Saúde e ao Ministério Público informando a situação e solicitando que não sejam encaminhadas novas pacientes pelo prazo de 24 horas para que a situação possa ser normalizada. A situação de superlotação na Maternidade tem sido comunicada à Central de Regulação diariamente, desde a última quinta-feira (4), no entanto, novas pacientes continuam sendo encaminhadas pela Regulação como Vaga Zero", conclui a nota.

Leitos - Em Campo Grande, segundo dados do Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde do DataSUS, a Capital tinha 137 leitos obstétricos até fevereiro deste ano. Eles ficam em instituições públicas como o Humap, o Hospital Regional de Mato Grosso do Sul e também em filantrópicas como a Santa Casa e privadas como a Maternidade Cândido Mariano.

Questionada sobre a falta de leitos disponíveis nos demais hospitais e a consequente superlotação do HU, a Sesau afirmou que está ciente da situação.

A pasta acrescentou que há muitas mulheres do interior de Mato Grosso do Sul sendo transportadas até lá. "Campo Grande é referência no atendimento terciário de mais de 33 municípios no Estado, sendo comum a transferência de pacientes destas cidades, dando o suporte e atendimento adequado a essas pessoas". 

Outras instituições estão sendo contatadas para evitar que a chegada de mais gestantes ao Humap, completou. "Neste momento, a Secretaria de Saúde, através da Superintendência de Relações Institucionais em Saúde, está em contato com todas as instituições contratualizadas pela pasta e que possuem maternidade visando a reorganização e redistribuição dos pacientes conforme a capacidade de cada uma destas unidades".

Matéria atualizada às 12h07 para acrescentar resposta da Sesau e às 10h02 de 10 de abril para corrigir informação relacionada à "vaga zero".

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