Capital

Apesar de lei, vítima de violência doméstica reclama de ineficácia

Luciana Brazil, Helton Verão e Elverson Cardozo | 04/10/2012 16:17
Mulher  grávida mostra marcas depois de apanhar do companheiro com uma barra de ferro. (Fotos:Minamar Júnior)
Mulher grávida mostra marcas depois de apanhar do companheiro com uma barra de ferro. (Fotos:Minamar Júnior)

Violentadas, constrangidas e amedrontadas. Depois da agressão, ficam as marcas, e as vítimas de violência doméstica encontram no Boletim de Ocorrência o primeiro passo contra o agressor. Mas diante da burocracia com que os inquéritos são conduzidos as críticas vêm à tona. A exigência de testemunhas, a demora nos julgamentos e a lentidão das investigações são algumas das falhas apontadas pelas próprias vítimas.

Grávida de cinco meses, a jovem de 28 anos apanhou com uma barra de ferro do atual companheiro, no último sábado. As marcas roxas pelo corpo denunciavam a ira do marido. Mesmo depois de ter um forte sangramento a criança passa bem.

As ameaças, geralmente, começam em seguida, e com Joice não foi diferente. “Ele já disse que vai me matar. Será que eu vou ser mais uma na estatística?”, questionou lembrando-se do caso em que a mulher morreu queimada em Campo Grande, no último fim de semana.

A jovem lamenta que o companheiro esteja solto e diz que se sente impotente diante da situação. “Para mim não está adiantando nada fazer o registro policial. Ele não foi preso e nem foi chamado para depor. Só estou ficando constrangida. É muita burocracia, eles exigem testemunha e às vezes as pessoas não querem nem ligar, quanto mais ser testemunha”.

O quadro de descrédito com a Lei Maria da Penha, criada para defender as mulheres de violência provocada pelos companheiros, tem sido assunto de críticas contundentes do ex-deputado federal  e radialista Sérgio Cruz. Nesta semana, ao comentar a instalação da 2ª Vara da Violência Doméstica e Familiar em Campo Grande, confirmada na semana passada. O apresentador do programa Tribuna Livre, da rádio Capital FM, afirmou que as mulheres agredidas não deveriam procurar as delegacias ou qualquer órgão de defesa, já que a “Polícia não resolve”.

Ele frisou que já tem recriminado a questão há algum tempo e citou o caso de uma jovem agredida pelo companheiro no ano passado, quando a vítima teria quebrado a clavícula. “Ela procurou a polícia e não resolveu, o julgamento será apenas em 2014”, comentou.

"É muito burocrático. E a polícia naõ faz nada sério, e quando faz o risco é que o cara vá lá e mate a mulher", desabafou a jovem que já foi inúmeras vezes até a delegacia fazer Boletim de Ocorrência contra o ex-marido.

 

Na delegacia da mulher, jovem relata a burocracia para resolver casos de violência doméstica.

“Não adianta a mulher agredida procurar a polícia se não tiver apoio da família. Procurando a polícia, o cara vai bater de novo”, aponta Cruz.

O apresentador deixou sua opinião durante edição do programa nesta semana e o assunto gerou polêmica em sua  página do Facebook. Sérgio Cruz defendeu mudanças na Lei Maria da Penha, e disse que a violência contra mulher deveria ser um crime inafiançável.

Segundo ele, ainda faltam entidades que façam a defesa dessas vítimas. “Existem poucos órgãos de defesa da mulher em Campo Grande e também no Mato Grosso do Sul”, diz.

Cruz defende que em curto prazo sejam criados mais órgãos de defesa e que agressão contra mulher se torne crime sem possibilidade para fiança. “O machismo não vai acabar”, completa.

 

O ex-deputado federal Sérgio Cruz,

Casos demais-  De acordo com a delegada Roseli Molina da Deam (Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher) a demora na resolução dos casos só acontece por causa da demanda. Por dia, são 70 casos recebidos pela Deam, segundo Molina, e só em setembro foram registrados 252 Boletins de Ocorrência, além de outros 117 procedimentos. Também no mês passado 20 homens foram presos em flagrante.

Em pouco tempo que a equipe de reportagem ficou na delegacia, quatro casos foram denunciados, sendo um de estupro e o de uma menina de 13 anos com suspeita de gravidez. Os casos mais frequentes, conforme explicou a delegada, são de violência física, ameaça psicológica e injúria.

Atualmente, são oito mil processos em andamento sobre violência domestica, segundo a delegada, que afirmou ainda que apenas um juiz não é suficiente para atender todos os processos. Molina ressaltou que se somados todos os procedimentos judiciais a quantidade não ultrapassariam o índice de violência domestica.

"Graças a mídia as mulheres estão criando coragem e denunciando. O exemplo da atuação da mídia é o caso de um estuprador de 2006 que foi preso no ano passado e logo depois mais quatro vitimas dele apareceram", destacou a delegada.

Com a instalação da 2° vara, Molina acredita que o tempo de espera para o agendamento das audiências seja reduzido em 50%.

Dados: Em 2011 foram feitos 6.210 boletins e até o dia 23 de setembro deste ano foram 4.228. A média de registros tem sido a mesma, segundo a delegada.

Para ela, os homens passaram a ter mais medo da lei, já que as mulheres denunciam mais. Antes da lei Maria da Penha a média anual era de 2 mil boletins por ano. Em 2012, foram 12 tentativas de homicídios e 3 assassinados em Campo Grande.

Penas: Para lesão corporal leve a pena é de seis meses a um ano. As lesões graves podem prever detenção de dois a oito anos. Para as lesões gravíssimas a pena varia de quatro a 12 anos e no caso de homicídio é de seis a 20 anos. Nas tentativas de homicídio a pena varia de 1 a 2/3 da pena do assassinato.

A Deam fica na rua Sete de Setembro e funciona das 8h as 18h. Mais informações pelo telefone 3384-1149 ou 3384-2946.

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