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Código Florestal nas mãos do Supremo

Por Tereza Cristina (*) | 27/02/2018 14:04

"Passados mais de cinco anos do início da vigência do Código Florestal, estamos prestes a ouvir do governo: muito obrigado pela sua declaração de culpa e pelas informações apresentadas, mas o benefício que nós te prometemos, por meio de lei federal, não será concedido"

A Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) acompanha com muita preocupação o julgamento das cinco ações sobre a constitucionalidade do Código Florestal (Lei nº 12.651/2012), em discussão no Supremo Tribunal Federal (STF).

Nesta quarta-feira (28), o ministro Celso de Mello manifestará seu voto, o último de todos os ministros, para desempatar o julgamento. A FPA chama atenção, especialmente, para a ADC 42, que apoiou-se na própria Constituição Federal para demonstrar que o trabalho exercido por centenas de parlamentares, debatido em dezenas de audiências públicas, com o posicionamento de vários técnicos e especialistas no assunto, tem o peso da representatividade popular.

Todo esse trabalho do Poder Legislativo ao longo de 13 anos não deve ser desconsiderado pelo Poder Judiciário, uma vez que a lei formulada, além de efetivamente proteger o meio ambiente e respeitar a Constituição, adveio da vontade de uma sonante maioria. E aqui, vale lembrar, vivemos em um país democrático.

Grande parte das questões já foi decidida pelo voto da maioria dos ministros que compõem a Corte, entre elas a constitucionalidade da definição de “leito permanente”, da possibilidade de cômputo de Reserva Legal dentro da Área de Preservação Permanente, das Cotas de Reserva Ambiental (CRA), e da possibilidade de servidão ambiental sob o excedente de Reserva Legal.

No entanto, chama atenção a catastrófica possibilidade de declaração de inconstitucionalidade dos parágrafos 4º e 5º do art. 59 da lei em debate, que previa a conversão do valor das multas ambientais ao reparo do dano causado ao meio ambiente, no momento da regulamentação da norma vigente à época.

Caso esse entendimento da Suprema Corte permaneça, temos instalado um cenário de insegurança onde os agricultores perderão o incentivo para recuperação das áreas em desacordo com a legislação.

Não se trata de anistia àqueles infratores, mas sim de uma conversão da multa pecuniária em serviço ambiental que efetivamente recuperará e auxiliará na proteção ao meio ambiente. Vale dizer que essa conversão só durará se e enquanto o proprietário cumprir com todas as obrigações que forem a ele impostas.

Para obter o direito à essa conversão de multa, o cidadão entregou ao poder público todas as informações pertinentes à sua propriedade: infrações, irregularidades, pontos críticos de proteção ao meio ambiente, etc. Essa farta informação está servindo muito bem ao governo, que pôde mapear precisamente o país quanto à sua topologia, biomas, áreas degradadas, entre outros.

No entanto, passados mais de cinco anos do início da vigência do Código Florestal, estamos prestes a ouvir do governo: muito obrigado pela sua declaração de culpa e pelas informações apresentadas, mas o benefício que nós te prometemos, por meio de lei federal, não será concedido, mesmo você tendo cumprido todas as obrigações que nós impusemos.

O ministro Dias Toffoli, durante o julgamento, foi muito feliz em traçar um paralelo dessa situação com a colaboração premiada, onde o Estado oferece ao criminoso a possibilidade de prestar informações que auxiliem na descoberta de outros crimes, em troca de redução na sua pena ou de outros benefícios. Caso o colaborador preste informações úteis e verídicas, ao final terá direito ao benefício combinado.

Portanto, não é justo, nem lícito, que depois de receber as informações, o Estado decida não conceder o benefício àquela pessoa, sob pena de violação do princípio da legalidade, da boa-fé objetiva, da ampla defesa, entre outros. O mesmo se aplica ao Programa de Regularização Ambiental, uma vez que o governo já obteve as informações que lhe eram convenientes, e agora cogita revogar os benefícios oferecidos.

Caso esse caminho seja seguido, a relação de confiança entre não só o produtor rural, como também de qualquer cidadão brasileiro, e o Estado, será para sempre manchada. Não haverá mais boa vontade do particular em auxiliar o governo em nada, pois o brasileiro é um povo que dá valor à palavra do outro.

Sem o auxílio desse incentivo de colaboração entre cidadão e governo, o Brasil não teria sido capaz, por exemplo, de mapear seu território e identificar os pontos críticos de proteção ambiental, nem as operações investigativas teriam avançado tanto a ponto de dar esperança ao povo no combate à corrupção.

Caso não haja mais colaboração – seja em sede penal, ambiental ou administrativa -, de quais avanços nós estaremos abrindo mão? Nós não sabemos dizer, mas a resposta agora está nas mãos e nos ombros de apenas um ministro do Supremo Tribunal Federal, cuja repercussão atingirá a vida de mais de 4 milhões de famílias brasileiras, sendo, em sua maioria, pequenos agricultores que contribuem com 50% da produção agropecuária.

(*) Tereza Cristina é deputada federal por Mato Grosso do Sul e atualmente ocupa a presidência da Frente Parlamentar da Agropecuária no Congresso Nacional.

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